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Ouçam bem: estas uvas são minhas!

Sãovignerons em versão lusa

A palavra francesa vigneron identifica um produtor que apenas usa a suas uvas para fazer os seus vinhos, sem aquisições fora. Para o consumidor menos familiarizado, essa prática seria a dos produtores-engarrafadores, esse sim, nome mais vulgar, até nos contra-rótulos. O equivalente de vigneron é, em português, vitivinicultor-engarrafador, um nome bem complicado e quase desconhecido. Como se sabe, se a mensagem não chega ao receptor, a culpa é do emissor e este é um bom exemplo. Ninguém sabe o que é um vitivinicultor-engarrafador porque até agora ninguém explicou.

No entanto, para o serem, têm de estar inscritos como tal e a fiscalização é, dizem-nos, muitíssimo apertada. Procura-se assim evitar o chico-espertismo de alguém que queira tomar o nome e andar depois a comprar uvas, aqui e ali. Eles (os vignerons) existem entre nós e já se reuniram informalmente uma vez em 2024 por iniciativa da Quinta das Bágeiras que lá reuniu cerca de 15 produtores. Como grupo organizado fizeram agora a primeira apresentação em Lisboa. A obrigatoriedade de estarem inscritos naquela categoria acabou por restringir o grupo; são agora 10 e está fechado. Além dos produtores dos três vinhos da selecção de hoje, fazem parte a Tapada de Coelheiros, Quinta do Perdigão, Quinta das Bágeiras, Casa da Passarella, Quinta da Alameda, Quinta da Atela e Quinta de Chocapalha. O nome do grupo, “Vigneron – as nossas uvas, os nossos vinhos” – não poderá ser usado já que é provável que os franceses reclamem; talvez um símbolo, para já ainda não criado. A ideia do futuro próximo é apresentarem-se, pelo menos, uma vez por ano numa das quintas aderentes, em mostras abertas ao público. Muito habitual em França, onde os pequenos vignerons se contam por milhares, não raramente estes são projectos familiares que vivem muito das visitas que recebem e dos vinhos que vendem à porta da adega.

Esta ideia de só usar uvas próprias ainda que não original, é inovadora em Portugal. Devo confessar que sempre entendi que ela comporta algumas limitações. Repare-se: numa região (o Douro, por exemplo) onde há muitos produtores que vivem de vender uvas, pode acontecer (e este ano esteve quase…) que o produtor não encontre comprador para as suas uvas, independentemente da qualidade que apresentem. Assim sendo, vai ser difícil aceitar que o vizinho, a quem as uvas poderiam ser muito úteis, não as possa comprar por ser vitivinicultor-engarrafador. Há mesmo muitos produtores que andam sempre a tentar comprar uvas de pequenas parcelas, de vinhas velhas, de coisas originais que possam surgir.

Sabemos que os grandes vinhos têm muitas vezes origem neste lotear de uvas de variada origem onde se pode combinar uvas dos baixos e dos altos, de zonas frescas e outras mais quentes, tudo pensado para um certo perfil de vinhos que se vão fazer. Neste sentido, o conceito de vigneron pode ser um pouco limitativo mas tem, por outro lado um selo, uma marca que o consumidor entende e assume, percebendo que, este perfil do vinho que tenho à frente corresponde exactamente às uvas deste ou aquele produtor. Mas também temos de ser mais pro-activos e perceber que a compra à porta da adega, não só pode ter alguns benefícios em termos de custo, como nos faz perceber melhor o projecto. E, se calhar, ainda está para nascer melhor promoção do que o boca-a-boca, o “vai lá comprar que o vinho é óptimo e tem bom preço”!

Sugestões da semana:
(Os preços foram fornecidos pelos produtores)

Vale dos Ares Limited Edition Alvarinho branco 2021
Região: Vinho Verde Monção e Melgaço
Produtor: Miguel Queimado
Casta: Alvarinho
Enologia: Miguel Queimado
PVP: €25
Produção de 1300 garrafas. Resulta de um lote de uvas das diferentes parcelas da propriedade. Fermenta e estagia 8 meses em barrica usada.
Dica: este Alvarinho explica-nos porque devemos esperar pela casta. Pureza mineral, enorme frescura e complexidade. Excelente brilho concedido pela idade.

Casas Altas Rufete tinto 2023
Região: Beira Interior
Produtor: José Madeira Afonso
Casta: Rufete
Enologia: Nuno Mira do Ó
PVP: €13
Produção de 3800 garrafas. Vinificado em inox, permitindo assim uma melhor compreensão das características da casta.
Dica: muito aberto de cor (a marca da casta), acentua o lado vegetal seco com fruta escondida. Leve de taninos, um tinto de fácil abordagem, pensado para a mesa.

Terrenus Vinha de Marvão tinto 2022
Região: Alentejo Portalegre
Produtor: Rui Reguinga
Castas: vinha velha com 22 castas, das quais 8 brancas
Enologia: Rui Reguinga
PVP: €25
Vinha em socalcos a 800 metros de altitude. É um vinho de parcela, estagiou um ano em barrica usada. É a segunda edição e fizeram-se 2000 garrafas.
Dica: tem o brilho da altitude e da mistura de castas, características que aqui se soube preservar. Fino, delicado, rico, um enorme prazer na prova. Um hino às vinhas velhas.

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