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Grandes naus, sarilhos grandes

Os pequenos também têm dores

Comecei a minha vida profissional a sério na Moita, na outra banda, portanto. Foi já depois de por lá andar que fiquei a saber da existência de duas povoações com nomes curiosos: Sarilhos Grandes e Sarilhos Pequenos. É claro que são preferíveis os pequenos mas temos sempre a tendência para nos ensarilharmos em grande. Nós, na nossa vida particular, e os produtores e empresas dos vinhos a darem, com frequência, passos maiores que as pernas. O negócio do vinho esbarra quase sempre em obstáculos que se mostram complicados: se somos pequenos não temos dimensão para crescer, não conseguimos preços que compensem o investimento e, como acontece amiúde, não temos quem distribua, quem comunique, quem faça as cobranças.

Tudo assume uma componente de tragédia anunciada quando o pequeno produtor não tem descendência que lhe assegure a continuação do seu projecto. Nesta fase começam-se a cometer erros: as uvas deram-me muito trabalho, isto para compensar minimamente o que gastei e porque (claro, não é????) o meu vinho é bestial, vou comprar garrafas caríssimas, rolhas do melhor, encomendar o rótulo a um designer de nome e, claro, vender (pelo menos e já a perder dinheiro…) a €50 a garrafa. É verdade que há produtores que se convencem que o preço está certo porque fizeram provas cegas com a concorrência e o vinho até saiu muito bem. Esquecem-se é que as mil e poucas garrafas que têm para vender não representam nada e muito dificilmente se pode dizer que engrandeçam o país. Vender mil até pode não ser assim tão complicado, vender 100 000 é que é difícil, sobretudo a preço elevado.

Noutros sarilhos estão metidas as grandes empresas, porque têm de vender muito para manter as estruturas e porque têm o Trump em pano de fundo a tornar o negócio nebuloso. No entanto, diz-me quem exporta, é mais fogo de vista e que “a coisa” não vai ser tão grave. Vejamos: o consumidor americano que já ia comprar um topo de gama do Douro, por exemplo, pode, sem pensar muito, pagar mais caro à conta das taxas alfandegárias. No entanto, se estivermos a falar de vinhos vendidos a preço baixo e destinados a públicos de menores posses, tudo se tornará muito mais complicado. Procurámos saber os números da produção junto de algumas das grandes empresas do país e os números que avançaram são significativos: a Sogrape vende 65 milhões garrafas/ano, a José Maria da Fonseca com 12 milhões garrafas e 40 marcas, a Casa Santos Lima produziu 24 milhões de litros em várias regiões do país – tem 160 marcas e 600 referências; Winestone (Ravasqueira) com 12 milhões garrafas, Global Wines (Dão Sul) com 6 milhões garrafas e 35 marcas; Casa Ermelinda Freitas 25 milhões litros, 15 marcas e múltiplas referências.

Os produtores questionados foram peremptórios ao afirmar que não importam vinho. A Winestone não respondeu a este tema. Temos então os grandes com um grande sarilho em mãos e os pequenos, com sarilhos bem maiores, a acharem que são alguém porque colocaram os seus vinhos caros, ainda que poucos os conheçam. Quem entrar numa garrafeira, onde estão sobretudos vinhos de gamas média e alta, vai pensar que isto é um país de ricos. A verdade é que os vinhos caros estão lá mas… quem compra volta para comprar de novo, ou foi só uma curiosidade?

Sugestões da semana:
(Os preços foram fornecidos pelos produtores)

Adega Coop. Ponte da Barca Naperão Grande Escolha branco 2024
Região: Vinho Verde
Produtor: Adega Coop. Ponte da Barca
Casta: Loureiro (85%) e Alvarinho
Enologia: José Oliveira
PVP: €6,99
Tem 11 gr/açúcar por litro e leve gás carbónico, uma tradição antiga de muitos Vinhos Verdes que deverá continuar a existir, diversificando-se assim os perfis dos vinhos da região.
Dica: bem agradável na prova, é um branco de esplanada para quando os dias virarem quentes.

Vira Cabeças branco 2023
Região: Alentejo (Portalegre)
Produtor: Cabeças do Reguengo
Castas: antigas em field blend
Enologia: João Afonso
PVP: €20
1/3 do branco estagiou em barricas de tinto e isso justifica a tonalidade que o vinho apresenta. O aroma resulta original, bem interessante, com fruta madura e um estilo acentuadamente rural.
Dica: um branco de inegável sentido gastronómico, gordo mas de óptima acidez, tudo original. Pode, como curiosidade, guardar algumas garrafas.

Implante tinto 2022
Região: Alentejo
Produtor: Cas’Amaro
Castas: Aragonez, Castelão, Trincadeira
Enologia: Ricardo Santos
PVP: €10,30
Desta edição fizeram-se 7000 garrafas. Este produtor lançou ao mesmo tempo um tinto de 2023 feito exclusivamente com a casta Tinta Caiada. O projecto Cas’Amaro estende-se aos Vinhos Verdes, Douro, Dão, Lisboa e Alentejo.
Dica: aberto na cor, vivo na fruta fresca, leve no corpo, tudo a corresponder à actual moda de tintos. Fácil e gastronómico.

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