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Replantar ou arrancar, eis a questão

O país na eterna dúvida

1. Nos últimos anos temos assistido em Portugal a uma situação paradoxal: o país produz vinho em excesso mas continua a plantar vinha. Trata-se de um velho problema que já existia nos anos 30 do século passado e é recorrente. Isto tem levado, como aconteceu outrora, a campanhas para a destilação dos excedentes. O produto da destilação tanto poderá ter utilização industrial (álcool vínico) como poderá, como aguardente, ser usado como elemento indispensável dos vinhos generosos, como o Vinho do Porto. Aqui o factor qualidade pode entrar em jogo e as casas do Vinho do Porto, se conseguem melhor aguardente importada, não estão muito preocupadas com os excessos existentes por cá.

As campanhas subsidiadas à destilação têm boa intenção mas não têm em conta o chicoespertismo de muitos negociantes de vinho que, diz-se à boca cheia, foram comprar vinho a granel a Espanha para depois o vender aqui para destilar, ganhando bom dinheiro com esse negócio de cêntimos. Se juntarmos a isto o intenso negócio de granel que faz com que, mais uma vez, se vá comprar vinho do lado de lá da fronteira para alimentar o negócio do bag-in-box, percebemos que algo está mal.

É verdade que o consumidor que compra o pacote de 5 litros de vinho está mais interessado em ler a palavra Pias no nome do que verificar as letrinhas pequenas onde se lê: vinho da U.E. Pouca fiscalização, falta de meios das instituições para controlarem a circulação de vinhos e pouco escrúpulo de quem negoceia, são elementos indispensáveis desta negociata. Mas, como temos vinho a mais, o novo programa VITIS – reestruturação e reconversão de vinhas -, cujas candidaturas acabam este mês, aponta para a reestruturação da vinha com subsídios bem atractivos. Convenhamos que, se estamos a produzir de mais, o subsídio deveria ser para a diminuição da área de vinha (algo em marcha em Bordéus…) e não para a reestruturação da vinha.

Ao arrancar vinhas velhas decrépitas, e substitui-las por vinhas novas bem produtivas, estamos a aumentar e não a diminuir o problema. E depois, a seguir, vêm as consequências: mais vinho significa mais dificuldade em vender, preços a serem tendencialmente puxados para baixo, produtores que não recebem o suficiente pelas uvas que vendem entrando assim em dificuldade para pagar as despesas. No final da cadeia há mais explorações familiares a serem absorvidas pelos grandes grupos. Será que não se poderia transformar o subsídio à reestruturação em subsídio ao arranque? A parte boa do novo programa é que destina uma parcela significativa dos subsídios para as localidades (freguesias) fustigadas pelos incêndios de 2024.

2. Muitos projectos familiares que, com custo e muito investimento, criaram negócios de vinhos, tendem a chocar (e de frente) com a demografia: famílias com descendência reduzida podem ver-se num beco sem saída quando nenhum dos filhos tem intenção de continuar o negócio. Temos visto de tudo, desde alguns produtores que já conseguiram interessar a nova geração, até outros (e são muitos) que, por falta de continuidade, acabam por vender as propriedades. Solução? Procriar, procriar, como acontecia no tempo dos nossos pais. O negócio está cada vez mais profissionalizado e não se compadece com boas vontades. Vem sempre à tona a frase que diz (e bem): para se ganhar uma pequena fortuna nos vinhos, há que começar com uma grande fortuna!

Sugestões da semana:             

(Os preços foram fornecidos pelos produtores)

Grandjó Late Harvest branco 2021

Região: Douro

Produtor: Real Companhia Velha

Casta: Sémillon (Boal)

Enologia: Jorge Moreira

PVP: €40 (1/2 garrafa)

Tem origem em uvas atacadas de podridão nobre; tenta-se todos os anos, mas é difícil haver boas condições climáticas e daí a anterior colheita ter sido em 2013. A casta, francesa, chama-se Boal no Douro. Foram produzidas 6266 garrafas.

Dica: branco notável, muito semelhante ao que se prova em Sauternes, nos bons anos e de boas marcas. A doçura, combinada com a acidez, pede foie-gras mas as ligações são inúmeras e vão até ao queijo Stilton.

Primado branco 2023

Região: Dão (Santa Comba)

Produtor: Pereira de Melo

Casta: Encruzado

Enologia: Patrícia Santos

PVP: €24

A vinha de Encruzado, plantada em 1990, tem 2 ha, mas a primeira edição foi apenas em 2004. Este branco só se encontra na restauração e garrafeiras. 1250 garrafas produzidas.

Dica: muito fino e elegante no aroma, mesmo com leve redução que lhe dá alguma austeridade. Um belo branco, com anos pela frente. Mais dois ou três anos e estará no seu melhor.

Marquês de Tomar Reserva tinto 2022 

Região: DOC do Tejo

Produtor: Pedro Sereno

Castas:  Trincadeira, Baga, Alicante Bouschet

Enologia: Pedro Sereno

PVP: €15

Vinhas na região de Tomar, perto da albufeira do Castelo do Bode. 8000 garrafas produzidas. Boa combinação de notas florais e leves balsâmicos.

Dica: um tinto marcado pela elegância de conjunto, fruta e barrica em agradável diálogo. Intensamente gastronómico.

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