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Projectos pequenos e dores enormes

Devagar que tenho pressa

Quando assistimos ao arranque de um novo projecto de vinhos, sobretudo se se tratar de uma aventura familiar, ficamos sempre com um pequeno nó no estômago e sentimentos contraditórios. Se por um lado se aplaude a ousadia de iniciar uma aventura vínica num ambiente em que o negócio não corre bem a quase ninguém, por outro sobram as incertezas sobre a viabilidade do negócio. Com frequência, nesta ousadia encontramos uma razão familiar, como seja, os antepassados serem já proprietários de vinhas e fornecedores de uvas, ou vinho, quer a cooperativas quer a armazenistas locais. Em todo o território existem adegas cooperativas e, sobretudo, a partir dos anos 50, elas aglutinaram e receberam a produção de milhares de pequenos lavradores.

O projecto dos anos 40 previa a criação de 141 adegas cooperativas e embora o número destas adegas tenha vindo a diminuir drasticamente, elas ainda hoje são responsáveis por uma percentagem significativa do vinho que se produz em Portugal: o site da Fenadegas indica que esta organização abrange 45 adegas cooperativas, que representam 18 200 viticultores e um pouco mais de 27 000 ha. Depois, há também vários exemplos de gente bem-sucedida em negócios de variado tipo que por gosto pessoal se decide a avançar para um projecto vínico; neste caso costuma haver alguma folga financeira que permite renovar a adega ou fazê-la de novo, criar marca, ter enólogo competente e agência de comunicação. Em ambos os casos a aventura é sempre arriscada: o investimento no vinho exige dedicação a tempo inteiro, conhecimentos do mercado, noções de negócio em termos internacionais, bons canais de distribuição, viagens, presença em feiras internacionais para procurar importadores e, sobretudo, estar perto dos consumidores finais.

Não faltam exemplos de gerentes de lojas de vinho, que se queixam da quantidade enorme de pequenos produtores que procuram ali encontrar local de venda do seu vinho, chegando mesmo a propor condições absurdas, do tipo “fica aqui com o vinho e só me paga se vender” ou, pior ainda, “fica uma caixa de 6 e só paga 4” e outras sugestões que em nada ajudam o negócio em geral. Alguns restaurantes ficam muito agradados com estas “facilidades”. É mais ou menos a mesma situação que um músico se propor a dar um concerto “à borla” ou por 10 tostões, estragando com isso a vida a muitos profissionais que não podem embarcar nessas aventuras. Dizia-me um destes dias um enólogo que, “se não tenho uvas, tenho de começar pelo princípio que é pagar bem as uvas que compro, para interessar o lavrador no projecto, para incentivar a produção de mais e melhores uvas”. Esta ideia choca com práticas antigas e enraizadas de pagar as uvas ao mais baixo preço possível, como se, por milagre, tal contribuísse para elevar a qualidade das mesmas.

Começar um projecto do zero é uma dor de cabeça mas, diga-se também, se a única coisa que temos em mente é a venda em grande superfície, com promoções e descontos de 70%, é melhor dedicarmo-nos à pesca ou, quem sabe, à contemplação. Enquanto houver sol neste Inverno, é mais retemperador ficar a olhar o horizonte.

Sugestões da semana:
(Os preços foram fornecidos pelos produtores)

Bajancas Grande Reserva tinto 2022
Região: Douro
Produtor: António Alfredo Lamas
Castas: Touriga Francesa, Touriga Nacional e Tinta Roriz
Enologia: Pedro Sequeira
PVP: €11,50
Após várias etapas de plantações, a vinha ocupa agora 13,4 ha, dos quais 4,3 ha de brancas. A produção total ronda as 46 500 garrafas, das quais 17 666 deste Grande Reserva. Estágio de 18 meses em barrica. Vinhas em Trevões (Cima Corgo).
Dica: mostra-se muito bem, com aromas de fruta madura, bem casados com a madeira e um fundo floral. Muito gastronómico. Excelente qualidade para o preço.

146 Adega de Família Vinhas Centenárias de Chão de Areia branco 2022
Região: Reg. Tejo (Almeirim)
Produtor: Rui Fortunato
Casta: Fernão Pires em chão de areia
Enologia: Joana Pinhão
PVP: €20
A vinha tem quase 100 anos; a fermentação decorreu em barrica, cerca de 1/3 nova. Produção limitada de 730 garrafas. Compra directa ou através da CVR.
Dica: leve redução aromática (muito em voga) mas a mostrar um bom equilíbrio entre a fruta e a madeira. Tem volume, é fresco e tem perfil afirmativo.

Quinta dos Encados Grande Escolha branco 2022
Região: Vinho Verde
Produtor: Azevedo & Areias
Castas: Loureiro (60%) e Arinto
Enologia: António Sousa
PVP: €9
Produzido em Guimarães, numa vinha de 7 ha. O vinho 7 gr/açúcar por litro o que ajuda ao arredondado que se sente na prova.
Dica: bom equilíbrio entre aroma/corpo/acidez, resultando com bom desenho e muito apto para peixes e marisco. Sempre uma boa escolha.

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