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Portugal – as peneiras e a peneira

Ai, ai, andamos a dormir?

Com muita frequência chegam-nos informações muito díspares sobre o vinho português, a produção, o que se vende e o que se compra, quem é quem e onde estão os bons e os maus da fita. Em regiões como o Douro só se fala em uva a mais e especialmente este ano em que se espera (se o clima ajudar) uma produção brutal. Há empresas a comunicar que não vão à lavoura comprar uvas e isso, imagina-se, será uma verdadeira tragédia social porque os pequenos lavradores – na falta de quem os defenda – estão totalmente dependentes da compra da uva que produzem. Se não há compradores, o que vai acontecer?

Vai haver destilação dos excedentes? Vão fechar as pequenas explorações? Ao lado desta situação, a todos os títulos dramática, sabemos que Portugal é também um grande importador de vinho a granel oriundo de Espanha, que chega aqui a preços ridículos. É esse vinho que alimenta muito do que se vende em bag-in-box nas grandes superfícies e que é, sejamos realistas, o vinho cujos preços de venda são compatíveis com os baixos rendimentos da maioria dos consumidores. Se o excesso do Douro fosse vendido ao preço do granel nem pagaria a vindima.
Curiosamente, ao lado desta situação à beira da calamidade, continuamos a ser confrontados com vinhos que chegam o mercado a preços de ourivesaria. Fica sempre a dúvida sobre a quem se destinam os vinhos que se propõem a 80 ou 100 € a garrafa, sobretudo na quantidade que actualmente existem no mercado (várias centenas) e alguns mesmo a custarem várias notas de 100. O consumidor português deve ser muito especial, do tipo, “bora lá almoçar uma feijoada que vou ali comprar uma garrafa e dar €200 por ela”, situação que se sabe ser uma pura ilusão. Esses vinhos podem ser colocados no mercado a qualquer preço mas… quem compra uma vez, repete a compra? O vinho tem rotação ou fica na prateleira da garrafeira e do restaurante só para dizer que sim?

Portugal é um país de minifúndio, com 75% das explorações com uma área de vinha abaixo de 1 ha, com uma produtividade baixíssima, apenas 3,3% têm trabalhadores permanentes, ou seja, a esmagadora maioria assenta numa economia familiar não remunerada. O nosso grande sonho será conseguir aumentar a produtividade por hectare e fazer face à procura interna, o que não parece ser o caso, e é muito difícil de conseguir porque implicaria reestruturação da área de vinha, mecanização e aumento da produção, o que tem fortes limitações impostas pelas regras europeias. Bebemos muito mais do que produzimos, somos, de longe, os maiores consumidores per capita, já bem distantes da França: 51,6 litros/ano por cá (o turismo tem aqui um peso evidente) e 47,3 dos franceses; os espanhóis ficam-se por uns singelos 25,4. Já conseguimos aumentar o preço médio do vinho exportado e o valor total mas há muito por fazer e muita vinha para arrancar. Isto parece ridículo mas, dizem muitos produtores, “estávamos era a precisar de um ano miserável de produção para equilibrar isto!” Até agora tudo indica que não vai ser o caso. Não estamos bem (voltaremos ao assunto em próxima crónica) e não convém tapar o sol com uma peneira porque se vê tudo do lado de lá. Um quadro muito completo do que somos e para onde devemos ir vem no estudo “Avaliação de Impacto Socioeconómico em Portugal”, datado de Dezembro 2022 e publicado pela ACIBEV.

Sugestões da semana:
(Os preços foram fornecidos pelos produtores)

Adega Mayor Altitude Reserva do Comendador branco 2022
Região: Reg. Alentejano (Portalegre)
Produtor: Adega Mayor
Castas: muitas em vinhas velhas (70 anos)
Enologia: Carlos Rodrigues/Soraya De La Flor
PVP: €25
Uvas com origem na serra de São Mamede, ganhando por isso um perfil próprio derivado da altitude. Parte fermenta em barrica.
Dica: aroma fino, com elegância, com um bom equilíbrio. Pede para ser consumido à mesa; não é vinho de esplanada nem de piscina.

Aveleda Solos de Xisto branco 2022
Região: Vinho Verde
Produtor: Aveleda
Casta: Alvarinho
Enologia: Susete Rodrigues (actualmente Diogo Campilho)
PVP: €10
Além deste, existe um outro vinho da mesma colecção mas em solos graníticos. Acrescem mais dois vinhos de parcela: do Roseiral e do Convento, bons exemplares da pesquisa que aqui se leva a efeito, com Loureiro e Alvarinho.
Dica: grande delicadeza aromática, fruta fina, acidez perfeita na boca. Tudo a pedir peixe e marisco estivais.

Casa da Atela Castelão Vinhas Velhas tinto 2021
Região: DOC do Tejo
Produtor: Quinta da Atela
Casta: Castelão
Enologia: António Ventura/Filipe Catarino
PVP: €17
Tem origem numa vinha com 75 anos, em solos de areia que foi, entretanto, reenxertada. Foi feito em lagar de inox, estagiou em barrica, parcialmente nova. Produzidas 3000 garrafas.
Dica: aberto na cor e com aromas vegetais secos, muito bem organizado na boca, é um bom exemplar da casta. Grande vocação gastronómica e preço muito ajustado.

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