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Boas (quem sabe?) mas desconhecidas

E todas guardadas no baú

Longe vão os tempos em que, perante uma vinha velha, a primeira ideia que acorria ao produtor era: isto não produz nada de jeito, é uma trabalheira e o rendimento é fraco, o melhor é arrancar tudo e fazer uma vinha nova! Por via de atitudes como esta muito se perdeu em Portugal na voragem dos anos 90 em que, com ajudas comunitárias, se pôde replantar vinhas. Havia subsídios mas havia (e há) regras a cumprir, uma vez que o material a plantar tem de ser certificado por viveiristas que colocam, então, à disposição dos produtores os enxertos prontos, ou seja, compra-se logo a casta que já vem enxertada no porta-enxerto. Quem quiser replantar uma casta antiga que não exista nos viveiristas bem pode dizer adeus aos subsídios e essa limitação levou a que, quase todos, tenham optado pelo material certificado porque plantar e/ou replantar sem subsídio sai caro, muito caro mesmo. Portugal era um país muito rico em castas mas a verdade é que hoje são sempre as mesmas que se plantam, independentemente da região. Ficámos a perder em variabilidade genética e muitas variedades antigas foram morrendo, carenciadas que estavam de estudo que permitisse recuperá-las: eram frágeis, produziam pouco, estavam muito sujeitas a inúmeras doenças. Íamos batendo no fundo mas, em boa hora, os cientistas da vinha puseram em marcha um programa de conservação das castas e dos clones que delas se conheciam: nasceu assim a PORVID que, num campo em Pegões, mantém tudo o que é possível, quer de clones das castas quer de variedades que se procura evitar que morram. Alguns produtores resolveram também, a expensas próprias, fazer esse trabalho de recuperação.

Foi o caso da Lusovini que apostou nas variedades antigas do Dão. Dessa forma, e após algumas microvinificações para aquilatar o potencial dessas uvas, saíram para o mercado vinhos das castas Uva Cão – uma das que está a ter mais aceitação entre os produtores – Terrantez e Douradinha e as tintas Monvedro e Malvasia Preta. Chumbadas nestes testes foram, a Tinta Carvalha e as brancas Tamarez e Malvasia Rei. Ainda este ano, diz-nos a enóloga Sónia Martins, sairão mais três brancos, de Luzídio, Barcelo e Arinto do Interior. À espera de sair para o mercado estão ainda as tintas Coração de Galo e Cornifesto. Este movimento de recuperação tem tido alguma expressão na região (como nas vinhas do Domínio do Açor) e também no Douro (caso da Real Companhia Velha, entre outras empresas) onde algumas destas castas também existem. A Douradinha é casta de que se sabe pouco e João Afonso, no seu monumental livro, As Castas do Vinho (Oficina do Livro, 2023), lembra-nos que a primeira referência conhecida data de 1851 e que tem sinónimos curiosos como Alfrocheiro Branco, Branquinha, Fernão Pires do Beco e Engana Rapazes. A Douradinha punha a rapaziada em sentido! Como nos diz o autor “(…) não possui clones certificados nem material standard de multiplicação.” É assim que estamos e ainda bem que alguém assume os riscos de fazer estas variedades antigas renascerem.
Um dos outros vinhos seleccionados é da casta Avesso, uma variedade dos Vinhos Verdes que está em crescendo; é casta do interior, gosta de zonas mais quentes e viradas a sul, em solos graníticos. É, neste momento, das castas mais apreciadas na região, ao lado da Loureiro e Alvarinho.

Sugestões da semana:
(Os preços foram fornecidos pelos produtores)

Cazas Novas Pure branco 2022
Região: Vinho Verde
Produtor: Soc. Agr. Casal de Ventozela
Casta: Avesso
Enologia: Diogo Lopes
PVP: €15
Tem mais expressão sobretudo na zona de Baião, onde se conhecem mais clones e marcas. Fermenta em inox, onde estagia depois por 4 meses. Produzidas 6 000 garrafas.
Dica: Aroma combina as notas citrinas e o vegetal seco, apresenta um tom austero que lhe fica bem. Muito fresco, seco e de excelente acidez, um companheirão para a mesa.

Pedra Cancela Vinha da Fidalga branco 2022
Região: Dão
Produtor: Lusovini
Casta: Douradinha
Enologia: Sónia Martins/Casimiro Gomes
PVP: €34
Produção de 1 020 garrafas. O vinho estagiou no inox onde fermentou e posteriormente mais 8 meses em garrafa. Teor alcoólico: 11,5%
Dica: bonito na cor, aroma de fruta madura mas sem pesar, com palato fácil, ajudado pela baixa graduação. Um branco com boa arquitectura. Com mais grau e estágio em barrica daria o quê? Dúvida interessante.

Howard’s Folly Cristina tinto 2019
Região: Alentejo (Portalegre)
Produtor: Howard’s Folly Wine. Consultar: www.howardsfollywine.com
Castas: misturadas em field blend
Enologia: David Baverstock/Pedro Furriel
PVP: €70
Projecto de Howard Bilton que neste vinho homenageia Cristina Francisquinho, responsável da viticultura. Uvas da serra de São Mamede, origem em vinhas velhas. Fermenta em cuba e estagia 12 meses em barricas.
Dica: fruta madura e forte presença da madeira marcam o aroma que se revela cheio, com taninos bem presentes, muito boa estrutura. Um vinho longe da actual moda dos tintos deslavados.

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