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A dúvida do preço

Haverá formas acertadas de colocar o preço num vinho?

Por diversas vezes me interroguei sobre a fórmula usada pelos produtores para colocar o preço de um vinho na garrafa. Naturalmente que há várias famílias de preços, os de combate nas grandes superfícies, os de gama média que (todos dizem) são difíceis de vender e, depois, os vinhos mais caros, os tais que a maioria dos consumidores só lhes chega num dia muito, muito especial. Vamo-nos focar nestes últimos. Quando o produtor me diz que o preço de venda de um vinho é, por exemplo, €37,50 fico sempre a pensar porque é que não é 38 ou 36. A verdade é que os próprios produtores não arranjam uma justificação sensata. Muitos fazem a experiência de colocar o vinho em prova cega com outros adquiridos no mercado e da mesma gama de preço. Aí, e se se der o caso do vinho ficar bem classificado, está encontrada a razão para a colocação de determinado preço. Alguns não resistem à tentação de viciar esta prova, ou seja, quem prova é gente da casa que, como se imagina, conhece o vinho de trás para a frente e depois classifica-o nos primeiros lugares. Isso é viciar a prova e só se esta for feita com gente de fora é que os resultados podem ter alguma valia. Todos sabemos também que por mais custos que se imputem à pouca produção da vinha, aos cuidados extremos que ela exige, à poda feita com todo o cuidado, quase com tesoura de unhas, e ao preço das barricas novas (que, é verdade, está pelas horas da morte), todos sabemos que um PVP de €30 a garrafa cobre tudo isso e dá lucro. É claro que dará mais se houver dimensão no negócio porque, se forem 500 garrafas, é melhor esquecer o tal lucro. Mas há outras formas, bem mais divertidas, de colocar o preço. Lembro-me que, nos idos de 1975, numa mercearia perto da minha casa e que tinha sido encerrada pelas autoridades sanitárias (a ASAE de então) porque tinha ratos a comer as sacas de arroz e farinha, reabriu apenas para saldar os produtos resistentes aos roedores, como enlatados e vinho. Lá fui ver o que havia e deparei com uma botelha de Garrafeira Dom Teodósio tinto 1955. Com o ar mais blasé que consegui, dirigi-me ao balcão e perguntei qual o preço daquele vinho. O homem foi ao pé da prateleira, olhou para a garrafa e disse: ora bem, colheita de 55, são 55$! Tal valor seria qualquer coisa como 27 cêntimos a preços actuais. Pela mesma lógica se fosse um vinho mais novo ter-me-ia custado mais caro…Tal valor estava dentro dos meus limites de gastos e lá regressei todo feliz com o primeiro grande vinho, de uma marca então com muito prestígio e com um preço bem bom. Recordo-me que estava em muito boa forma quando chegou a hora dele. Como se vê pode ser fácil colocar o preço; estamos em 2024? Ok, são €24! E quanto à minha barreira de limite de gastos, ela situava-se exactamente nos 25 cêntimos, valor que à época (50$) permitia comprar vinhos de topo (fosse lá o que isso queria dizer na altura…). Tais valores foram rapidamente aumentados, em função da inflação galopante que se seguiu aos anos da brasa. Mas não me esqueço que fiquei a dever aos roedores o meu primeiro tinto de referência. É claro que, face a estes preços, a minha primeira garrafa de Barca Velha de 1966, adquirida, creio que em 1978, custou uma pequena fortuna, algo como 220$, ou seja, €1,20 a preços actuais! A vida é dura para o enófilo…

Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)

Verónica branco (lote colheitas 2021 e 22)
Região: Alentejo (Portalegre)
Produtor: Francisco Fino (Monte da Penha)
Castas: Arinto, Roupeiro, Fernão Pires e Trincadeira
das Pratas (Tamarez)
Enologia: Francisco Fino & Susana Esteban
PVP: €38
Vinha de 2 ha em solos graníticos e argilo-calcários com xisto. Feito em inox. Foram produzidas 2936 garrafas.
Dica: excelente cor citrina, leve redução no aroma o que salienta o lado austero e mineral. Gordo e envolvente na boca, dá boa prova e muito prazer a beber.

Valle Pradinhos Touriga Nacional Grande Reserva tinto 2019
Região: Trás-os-Montes
Produtor: Maria Antónia Pinto Azevedo
Casta: Touriga Nacional
Enologia: Rui Cunha
PVP: €43
Deste tinto fizeram-se 7240 garrafas. A zona de produção é Macedo de Cavaleiros, por muitos tida como terra abençoada para vinhos, azeites e fruta. Este é produtor bem antigo e de referência da zona.
Dica: associam-se aqui as notas mais frescas e florais da casta com uma boa estrutura de boca, com amplitude e muito sabor. Um sucesso garantido.

Pedra Cancela Vinha da Fidalga tinto 2022
Região: Dão
Produtor: Lusovini
Casta: Monvedro
Enologia: Sónia Martins/Casimiro Gomes
PVP: €34
Produção de apenas 1180 garrafas. Esta é casta residual na região, cremos ser este o único exemplar dela. Tem várias sinonímias, algumas extravagantes como Preto João Mendes, mas também Bastardo. Tinto feito e estagiado em inox.
Dica: ligeiro na concentração, apresenta aroma floral bem atraente, acrescido de frutos vermelhos e notas vegetais e uma claríssima vocação gastronómica.

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