E, se recuarmos muito, só paramos na Bíblia Acontece com frequência. Temos tendência a pensar…
Devíamos ser mais generosos com os nossos vinhos
As culpas são repartidas por todos
Quando falamos de generosos e o assunto é vinho, por norma falamos de três tipos: Porto, Madeira e Moscatel. Este é, sem dúvida, o trio maravilha de que nos podemos orgulhar, ao qual agora deveremos acrescentar o Carcavelos. A melhor manifestação desse orgulho deveria traduzir-se num consumo regular daqueles vinhos mas… falamos, falamos, mas não consumimos. Todo o português que se preze tem uma garrafa de Porto em casa mas, à força de esperar pelo momento certo para a abrir, vai acabar por beber um vinho decadente, se não mesmo morto. Depois vai falar a toda a gente que afinal o Vinho do Porto é uma treta quando é ele próprio o culpado de ter bebido um vinho sem graça. Em boa verdade a culpa é também repartida pelas empresas do sector, sem excepção. Ninguém promove, ninguém explica como se consome e ninguém diz o que é para guardar e o que é para consumir asap. A restauração também não sai bem na fotografia. Tente o leitor recordar-se da última vez que num restaurante o empregado lhe sugeriu que com esta sobremesa o que vai bem é este Porto ou aquele Moscatel. Não se lembra, pois não? É que, na restauração também acontece o que, há algum tempo, o dono de uma casa sempre cheia e onde se sai sempre a pagar pelo menos €40 por pessoa, me disse: ficarem a beber Vinho do Porto? Nem pensar, depois nunca mais se vão embora e o que eu quero é rodar as mesas! Pois é, a folha Excel fala mais alto e o negócio não se prende com bebidas que suscitam conversas e ambiente descontraído, sem horas marcadas. Tentei há dias lembrar-me exactamente da última vez que o sommelier de serviço tinha feito o trabalho que lhe competia e não me recordei. Alguns restaurantes vão argumentar que têm garrafas abertas à disposição dos clientes, nomeadamente tawnies e Colheita; o que já não dizem é há quanto tempo as garrafas estão abertas e o vinho que vão servir está, provavelmente, sem vida e sem graça. A coisa nem parece assim tão complicada. Vejamos: abre-se uma garrafa de Porto vintage, por exemplo, passa-se o vinho para um decanter e diz-se ao cliente: hoje temos este vintage aberto que vamos servir a copo. O preço a cobrar (e há vintages a preços cordatos) levará o cliente a concordar com a ideia e, ao fim de 8 ou 10 copos a garrafa está esgotada; amanhã abre-se outra, até de outra marca, e o cliente sabe que o vinho está em plena forma. A sobremesa inclui citrinos? O Moscatel poderá ir na perfeição! Se for pudim ou leite-creme o tawny velho, o Colheita ou mesmo um Madeira Bual ligarão perfeitamente. A casa tem uma boa carta de queijos? O Porto LBV entra perfeitamente nesse jogo. O que seguramente não faz qualquer sentido é termos dos melhores vinhos generosos do Mundo, e dos mais originais, e não fazermos nada por eles. E o renascido Carcavelos? Estamos a falar de um vinho muito elegante e polivalente que alegrará qualquer mesa. Todos têm a sua tarefa, as autarquias das regiões produtoras, as empresas, os fornecedores de copos (sim, que não se pode beber e ter prazer num bom generoso com copos miseráveis) e quem escreve sobre o tema, quem pontua, quem organiza eventos. Neste tema não há santos de um lado e pecadores do outro. Todos têm de arregaçar as mangas.
Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)
Soalheiro branco 2022
Região: Monção e Melgaço
Produtor: VinuSoalleirus
Casta: Alvarinho
Enologia: equipa dirigida por António Cerdeira
PVP: €11,50
Esta foi a primeira marca deste produtor, criada em 1982, tendo sido o primeiro Alvarinho de Melgaço no mercado. É actualmente a marca-bandeira da casa, da qual se fazem 300 000 garrafas.
Dica: aroma muito fiel à casta, pleno de fruta, macio na boca, leve sensação de doçura que lhe dá um bom envolvimento. Muito polivalente.
Rabo de Ovelha Vinha do Monte do Poço branco 2022
Região: Reg. Alentejano
Produtor: Casa Relvas
Casta: Rabo de Ovelha
Enologia: Nuno Franco
PVP: €9
O vinho tem origem numa parcela plantada no sopé da serra do Mendo; estagiou 4 meses em barricas de 400 litros. Graduação muito ajustada de 11,5%.
Dica: perfil aromático moderno, de bom impacto de fruta citrina, aqui a ajudar a casta que por si é pouco exuberante. Resulta harmonioso na boca e muito bom para a mesa, desde já.
Poças Fora da Série Lagar das Quartas tinto 2021
Região: Douro
Produtor: Manoel Poças Junior
Castas: Touriga Francesa, Tinta Amarela, Malvasia Fina e Tinta Roriz
Enologia: André Barbosa
PVP: €19,50
Parcela com uvas brancas e tintas, vindimadas a eito e pisada a pé em lagar. Termina a fermentação em inox onde fica sobre borras até ao engarrafamento. 6603 garrafas.
Dica: aberto na cor, muito acessível no perfil, elegante, directo e sem segredos. Excelente para pratos leves.
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