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O charme da velha quinta

Assim até dá gosto

Visitei há uma semana a Quinta d’Aguieira. Está incluída na Bairrada mas, provavelmente, não por mérito mas por outras razões (políticas? pessoais?), não se sabe bem. O facto de ter pertencido ao Conde de Águeda poderá ter tido alguma influência. A verdade é que, quando ainda no séc. XIX, António Augusto de Aguiar desenhou o mapa a que chamou o Paiz Vinhateiro da Bairrada, a região terminava imediatamente acima de Sangalhos, em Oliveira do Bairro, povoação vizinha. Considerava-se que, sendo a casta emblemática a Baga, em tintos, o norte da região já não produzia vinhos de embarque (os melhores) mas sim vinhos de consumo e, mesmo estes, estavam organizados em várias classes. Quanto mais nos afastamos do centro da região, dizia A. A. Aguiar, mais variações se encontram em termos de solos e, consequentemente, de vinhos. Ficamos então a saber que a Quinta d’Aguieira lá ficou inserida na região, quando foi feita a demarcação em 1979. Os seus vinhos, provavelmente associados aos ilustres proprietários, eram famosos, desde os anos 20 e 30 do século passado. Sem recuar tento no tempo, recordo-me que nos anos 70 e 80 era normal encontrar estes vinhos no mercado e na restauração. Eu próprio, então jovem entusiasta sem formação ou «escola», recordo-me de ter a marca em conta como sendo das mais sofisticadas (e caras) que eu conseguia comprar. Na minha colecção de rótulos constam, divididos em Colheita e Garrafeira, os tintos dos anos 1959, 65, 66, 70, 74 e 77. A graduação vinha impressa no rótulo e em todos era 11,5%; em alguns deles vinha a indicação Produit et Mis en Bouteilles en Domaine e Estate Produced and Bottled. Nem mais! Em todos e em letras bem visíveis: Vinho Velho. Longe ainda estavam os tempos em que os consumidores desataram numa correria a beber vinhos novos, com muito álcool e muita madeira. A quinta teve os seus sobressaltos a seguir à revolução e, depois de várias vicissitudes, acabou comprada pela família Guedes, da Aveleda. Com o bom gosto que se lhes reconhece – basta visitar a quinta em Penafiel e a casa de família em Avintes – não é de estranhar o que aqui aconteceu: o interior foi minuciosamente recuperado mas com a intenção, concretizada, de manter o «espírito do lugar»; tudo tem o ar antigo que é suposto mas com o conforto que nos levaria a pensar qualquer coisa do género: passava-se aqui uma belas férias! Em casa e nos jardins. Dinheiro e bom-gosto nem sempre andam juntos mas às vezes andam juntos e até casam…! Na hora, após inesperado trambolhão na cave escura que me deixou a coxear e pulso dorido, provámos um desses tintos antigos, eventualmente de 65 (rótulo em muito mau estado) que deu um prazer enorme (imagem em cima). Todo ele em delicadeza, com grande frescura ácida, leve, fino e cheio de carácter. Um tinto e tanto. Tive sorte: não há bons vinhos velhos, há boas garrafas de vinhos velhos! Naquele ambiente de velho solar onde se sente o peso da História, este vinho, e provavelmente nenhum outro, se adequaria melhor. Há dias assim. Agora que acabei de escrever vou voltar a pôr a ligadura no pulso qu’isto ainda vai demorar a passar…

Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)

Quinta de Monforte branco 2021
Região: Vinho Verde (Penafiel)
Produtor: Daniel Rocha
Casta: Loureiro
Enologia: Francisco Gonçalves
PVP: €11
Quinta de 100 ha com 40 ha de vinha, muita dela em socalcos como no Douro. Plantações de 2014. O portefólio inclui outros vinhos. 3000 garrafas de Loureiro.
Dica: citrino na cor, muito verde no aroma (louro e limão), excelente frescura de boca. Equilibrado e intensamente gastronómico. Boa aposta.

Altitude by Duorum tinto 2020
Região: Douro
Produtor: Duorum Vinhos
Castas: Touriga Nacional. Touriga Francesa e Tinta Roriz
Enologia: João Maria Portugal Ramos
PVP: €8
Uvas das cotas mais altas da Quinta de Castelo Melhor (Douro Superior). Mais leve (quer o vinho quer a garrafa) e mais fresco. Estágio em inox. Só disponível em garrafeiras e restauração.
Dica: muito atractivo no aroma, frutos vermelhos muito vivos, sem máscara. Boa harmonia na boca, elegante, cheio de fruta. Absolutamente consensual.

Maçanita irmãos e enólogos tinto 2020
Região: Douro
Produtor: Maçanita Vinhos
Castas: Touriga Nacional, Sousão e25% mistura de castas na vinha
Enologia: Joana e António Maçanita
PVP: €11,85
As uvas têm origem no Cima Corgo, o coração da região. Fermenta e estagia em inox. 15 000 garrafas produzidas. Contra-rótulo quase ilegível.
Dica: clássicos aromas do Douro, com abundantes notas vegetais secas secundadas pela fruta. Taninos polidos, médio corpo. A beber jovem.

 

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