Dizer que temos uma garrafa em casa não chega Um dos vinhos que seleccionei esta…
Guardar mas com juízo
As conclusões possíveis de uma prova de tintos
Fiz há poucos dias uma prova alargada de vinhos tintos já com alguma idade, em torno dos 10 anos. Estes são momentos sempre importantes porque nos dão uma medida da qualidade: das castas usadas, dos métodos de produção utilizados, das variações de região para região e do ano climático. Com esta idade existe uma enorme diferença entre garrafas da mesma marca e do mesmo ano que tenham estado guardadas em locais distintos. No entanto, convém não entrar em delírio perfeccionista, argumentando que só as que estiveram 10 anos em caves climatizadas é que se conseguem beber. Essas serão, creio, as que mostrarão melhor saúde e mais juventude mas, convenhamos, se comparadas com outras que estiveram num apartamento normal, não especialmente quente nem frio, é provável que não haja uma diferença substancial. Quanto mais idade somarmos a esses 10 anos, mais diferenças se irão encontrar, aí (infelizmente) acrescidas de variações indesejáveis motivadas pela rolha. É normal que numa prova de 20 ou 30 vinhos existam alguns com variações aromáticas que são desvios em relação ao aroma que deveriam apresentar. Se calha a não conhecermos o perfil do vinho, vamos aceitar que está a evoluir mal quando, afinal, ao abrir uma segunda garrafa do mesmo vinho, se percebe que a rolha foi a responsável por esse desvio. A principal conclusão que se deve daqui tirar? Que é redutor dizer que um vinho não está bem ou que evoluiu para o torto se não tivermos a contraprova de uma segunda garrafa. Muito se especulou sobre a capacidade da “nova enologia”, nascida nos anos 90 do século passado, de gerar vinhos de grande longevidade. A tradição dizia que um vinho, para durar muito em cave, tinha de ser duro e difícil enquanto novo, com taninos rijos e acidez agreste. De facto, esses eram os vinhos que os nossos pais bebiam, muitos deles com 10 anos de tonel antes de serem engarrafados. Havia depois as situações limite (Bairrada e Colares) em que 10 anos não chegavam, era preciso esperar o dobro do tempo. Pois esses tempos acabaram, hoje contam-se pelos dedos de uma mão os produtores que colocam vinhos “imbebíveis” no mercado, de tão duros e tão novos. A verdade é que os novos métodos de vinha e adega mostraram que é possível fazer vinhos que, ainda que agradáveis logo em novos, não perdem qualidades se forem conservados em cave. É provável (mas é cedo para saber) se chegarão aos 50 anos de idade mas, por mim falo, não tenho meio século pela frente para esperar por um vinho e nem creio que esse seja o critério. É muito válido, sim, mas para Vinho do Porto, da Madeira e outros generosos. E, diga-se, a moderna enologia também recuperou técnicas antigas de produção de brancos que os tornam muito longevos. Gostos não se discutem mas entendo que o prazer que dá um tinto a ser consumido no melhor momento da evolução, algures entre os 10 e os 20 anos, não tem comparação com outro bebido à saída da adega. Os franceses de Bordéus ensinaram-nos isso e criaram a regra: compre novo (que será mais barato) mas guarde-o em casa para beber mais tarde. Não tem condições de guarda em casa? Então esta crónica de nada lhe serve. Compre num retalhista de confiança e beba o seu tinto polido e já moldado pelo tempo. Vai ver que vale a pena.
Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)
Bagos Riesling branco 2017
Região: Reg. Duriense
Produtor: Lavradores de Feitoria
Casta: Riesling
Enologia: Paulo Ruão
PVP: €18
A marca Bagos passará a identificar os vinhos varietais. Uvas do Palácio de Mateus, em Vila Real. Os associados da empresa têm 600 ha de vinhedos. Beneficia em complexidade por estar a ser vendido com alguns anos
Dica: maduro na fruta, leves apetrolados típicos da casta, excelente no volume, acidez e proporção.
Esporão Aragonez tinto 2017
Região: Alentejo
Produtor: Esporão
Casta: Aragonez
Enologia (à época): David Baverstock/Sandra Alves
PVP: €28
Pisa em lagar de mármore e aí inicia a fermentação, depois passa para cubas de betão. Posteriormente estagia em barricas novas durante um ano.
Dica: muito bom polimento de fruta e estrutura, especiado e rico. Seguramente com amplas possibilidades de associação vinho/comida. Deixe-se tentar.
Dona Maria Grande Reserva tinto 2018
Região: Alentejo
Produtor: Júlio Bastos
Castas: Alicante Bouschet, Touriga Nacional, Petit Verdot e Syrah
Enologia: Sandra Gonçalves
PVP: €38 (preço médio, pode haver variações)
Fermentação em lagares de mármore e estágio em barricas novas de carvalho durante um ano.
Dica: deste lote (agora já clássico na região) resultou um tinto maduro mas com elegância, com muita proporção entre todas as componentes. Um sucesso.
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