Já é possível algum balanço da vindima de 24 À hora desta crónica “vir a…
Os vinhos e a sua filosofia
Parece que não ganhamos juízo…
Um dos temas recorrentes no sector do vinho é o preço a que alguns deles surgem no mercado. Há uma espécie de espiral alucinante que leva muitos produtores a acharem que os seus vinhos topo de gama, ou custam 100 ou 200 € a garrafa ou então não valem um caracol. Isto começa logo mal em virtude do verbo achar, grande responsável de uma corrente do pensamento contemporâneo conhecida por «achismo» em que todos acham qualquer coisa, a maior parte das vezes sem qualquer fundamento. Os vinhos são colocados em patamares proibitivos de preço «porque sim» e este «porque sim» pode ter várias razões explicativas: o vinho vem de uma vinha muito velha; o vinho é muito difícil de fazer; tem uma produção homeopática (como quem diz, ridícula); o vinho é muito original; o vinho tem imensa procura e pouca oferta e por aí fora. Todos já deveríamos saber que a progressão dos preços não é geométrica mas sim um processo mais ou menos longo que pode demorar anos. O exemplo do Esporão Reserva que hoje sugiro é bem significativo mas poderia dar outros exemplos, como o Cartuxa tinto: vinhos que se vendem num patamar de preço relativamente elevado, mas abordável, e que são feitos em quantidades enormes. Agora fica a pergunta: alguém acredita que o Esporão Reserva chegou aqui do nada? Como se diz na caixa, começou em 1985. Já são uns aninhos, convenhamos. E isto de comprar só por exibicionismo não resiste a uma prova que proponho que os leitores façam com amigos: junte 8 ou 10 vinhos de preços muito diferentes, sirva tudo com as garrafas tapadas e peça a cada um que diga, em relação a cada vinho, quanto é que estaria disposto a dar por ele ou, em alternativa, quanto é que entendia razoável que o vinho custasse no mercado. A brincadeira poderá ter resultados muito inesperados e nos dois sentidos: vinhos baratos aos quais os consumidores atribuem um preço bem elevado e outros, caros, que saem desvalorizados. Pode então concluir-se que a colocação do preço é por vezes aleatória. A partir de certo valor de prateleira já não é o preço da barrica, a produtividade por hectare, o granjeio, o preço das garrafas ou das rolhas que vai determinar o preço final. O preço é fixado num determinado valor porque sim, porque «o meu não fica atrás do vizinho que também tem um vinho caríssimo» e «se não se vender, bebo-o eu», frase que já ouvi a vários produtores. E depois há, finalmente, um aspecto a ter em consideração: se eu pago muito por uma garrafa, devo chegar ao fim e ser capaz de dizer que o dinheiro foi bem empregue porque o vinho me impressionou os sentidos, porque fiquei com a certeza de estar perante um grande, grande vinho. Ora esta sensação é rara e temo que não seja a que os consumidores terão em relação a muitos dos vinhos realmente caros que estão a surgir no mercado. A consequência da desilusão vai assim ao encontro do conhecido ditado: à primeira qualquer cai, à segunda só cai quem quer! Ora, voltando ao início, estou capaz de «achar» que não é este o caminho.
Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)
Esporão Reserva Biológico tinto 2021
Região: Alentejo
Produtor: Esporão
Castas: Alicante Bouschet, Trincadeira, Touriga Nacional, Aragonez, Cabernet Sauvignon
Enologia: Sandra Alves/João Ramos
PVP: €20
A primeira edição do Reserva foi em 1985. As castas fermentaram separadamente em vários tipos de depósito – cimento, inox, lagar. Estágio de um ano em barrica (20% novas). 600 000 garrafas em formato normal e 10 000 em magnum.
Dica: este é um grande companheiro que nunca nos engana, polido, afinado, com estrutura e imensa aptidão gastronómica. Beba agora mas também guarde algumas garrafas.
Quinta Nova Vinha Centenária Refª 28 tinto 2020
Região: Douro
Produtor: Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo
Castas: Tinta Roriz e 25% de vinha centenária
Enologia: Jorge Alves
PVP: €90
A vinha centenária apresenta um ar débil, sem exuberância, a mostrar algum cansaço da vida. Aqui a ligação com outra casta ajuda o conjunto.
Dica: este é um terroir de eleição para a Roriz, o vinho é vegetal, fechado mas cheio de energia e classe. Um vinho de referência do Douro.
Cabriz Ímpar 9ª Edição
Vinho Licoroso
Produtor: Global Wines
Castas: Touriga Nacional, Tinta Roriz, Alfrocheiro e Jaen
Enologia: Osvaldo Amado
PVP: €27,50
O vinho não tem Denominação de Origem. Foram feitas 1001 garrafas de 0,50 l. Esteve cerca de 20 anos em estágio em meias barricas usadas.
Dica: cor tawny, muito fino de aroma, frutos secos, ceras, licores. Macio, doce e fresco na boca. Um prazer. Beba refrescado.
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