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Será que bebemos de mais?

As estatísticas não ajudam e a restauração complica

As notícias recentes dão conta de um aumento do consumo de álcool e tabaco entre nós. À primeira vista os números podem assustar mas responder positivamente à pergunta: bebeu álcool nos últimos 30 dias? Só por si isso está longíssimo de ser motivo de preocupação; mais do que a frequência, é a quantidade e o teor de álcool que interessam. Todos sabemos que o consumo desenfreado de bebidas de elevado teor alcoólico é muito mais significativo nos consumidores mais jovens e, nos mais velhos, é o brandy e o bagaço que estragam as estatísticas. O vinho acaba sempre por ser um parente pobre nesta equação. O negócio do vinho não está a correr nada bem; as exportações estão a cair (e no Vinho do Porto também), há muito vinho em stock e no Alentejo fala-se mesmo em duas colheitas em casa, sem escoamento à vista. Já se imagina o que isto vai originar: a queda dos preços pagos à produção, com os «tubarões» a pressionarem para que o vinho seja vendido a preços irrisórios. Escoam-se stocks, limpa-se a adega (uma nova vindima está aí à porta…) e todos empobrecem alegremente. E o que faz a restauração? Facilita o consumo, baixando preços e tornando aliciante o consumo ao cliente? Não, a restauração vai tirar partido do facto de poder agora comprar mais baixo e vai continuar a vender caro, nalguns casos «estupidamente caro», com brancos e tintos a mais de €20 na lista de vinhos, os mesmos que se compram nas grandes superfícies a €4. A conversa que se ouve é sempre a mesma: se não for nas entradinhas que nos esperam já na mesa (e que não foram pedidas), nos vinhos e nas sobremesas, «não se ganha dinheiro no negócio», diz-se. Ora algo não está certo nesta afirmação quando sabemos que basta atravessar a fronteira, ir a Tui por exemplo, e perceber que se bebe um belo tinto à mesa do restaurante por um preço pouco superior ao que se paga na garrafeira. Já coloquei inúmeras vezes esta questão a empresários de hotelaria mas nunca recebi uma resposta convincente. Alguns até me disseram que por lá se foge aos impostos, e que é tudo por baixo dos panos, ou seja, uma argumentação muito pouco credível. A verdade é que lá ninguém se sente defraudado. Por cá, pode dizer-se, é uma miséria: vendem-se na restauração vinhos que não deviam lá estar porque, exactamente, são vinhos de supermercado e é escandaloso aplicar-lhes margens de 500%; não há consumo de generosos porque as empresas que os produzem não fazem promoção, porque muitos sommeliers (onde existem) são preguiçosos e não os propõem ao cliente e porque o que o restaurador quer é ver os clientes pelas costas, para rodar a mesa, em vez de ter ali convivas que não «desamparam a loja»: antigamente porque ficavam a fumar, e agora porque, com o Porto ou outro generoso, nunca mais dali saem. Estamos a beber menos vinho e a consumir mais álcool? Com incentivos destes não admira. A restauração de qualidade não pode entender que o cliente só liga à frescura do peixe. O cliente não pode ser tomado por parvo mas também tem de ser mais exigente e reclamar, reclamar sempre que tenha razão: nos preços, nos copos, na temperatura de serviço. Com preços disparatados não vamos a lado nenhum. Por isso, cada vez mais, levo o vinho de casa e pago, se tal me exigirem, a taxa de rolha.

Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)

Quinta de Camarate branco seco 2022
Região: Reg. Pen. Setúbal
Produtor: José Maria da Fonseca
Castas: Alvarinho e Verdelho (15%)
Enologia: equipa de enologia de J. M. Fonseca
PVP: €9
Marca clássica da casa, remontando o seu nascimento a 1986. As castas de que é feito têm variado ao longo do tempo. Pensado para o consumo em jovem. Também existe na versão branco doce.
Dica: álcool moderado, fruta citrina e levemente tropical fazem deste branco com companheirão para pratos leves de Verão.

Quanta Terra Phenomena Pinot Noir rosé 2022
Região: IGP Duriense
Produtor: Quanta Terra
Casta: Pinot Noir
Enologia: Celso Pereira/Jorge Alves
PVP: €25,90
A origem das uvas é o planalto de Alijó. Feito em inox, teve depois um estágio de seis meses, metade em inox e metade em barrica.
Dica: mais harmonioso e menos radical que em anteriores edições, um rosé de grande valia gastronómica, fino e muito elegante.

Vallado Tinta Roriz tinto 2020
Região: Douro
Produtor: Quinta do Vallado
Casta: Tinta Roriz
Enologia: Francisco Ferreira/Francisco Olazabal
PVP: €30
A quinta, que integrou o património de Dona Antónia Adelaide Ferreira, pertence hoje a herdeiros. Os dois enólogos são seus descendentes.
Dica: a casta é por vezes mal-amada mas este vinho mostra-se muito harmonioso, tenso e sério e a revelar ser parceiro para pratos de carne de bom tempero.

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