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Dialogar com a madeira…mas com rédea curta

É da educação do vinho que falamos

Um dos vinhos que sugiro hoje, um branco do Alentejo, teve um estágio de um ano em barrica sem que a dita fosse aberta e o vinho arejado e/ou passado a limpo. A Ravasqueira já tinha ensaiado antes algumas práticas de ligação vinho/madeira que não eram habituais, uns vinhos então chamados Ravasqueira Premium. Desta vez deixou-se o vinho sossegado durante um ano. É uma prática possível. A madeira é uma ancestral parceira do vinho, quase sempre usada como depósito de conservação, tradicionalmente em grandes formatos. Quem não se lembra dos enormes tonéis que havia nas caves do Ribatejo, da Estremadura, da Bairrada ou do Dão? O uso destes tonéis enormes não se destinava a marcar o vinho com aromas (o que acontece se a barrica for nova) mas antes a amaciá-lo, domesticar os taninos e permitir que o tinto, por vezes após 10 anos de estágio no tonel, pudesse ser bebível. Os brancos, se guardados desta forma, iam oxidando lentamente, ganhando mais cor, aromas resinosos e de fruta muito madura. Este panorama clássico e tradicional alterou-se quando os produtores olharam para a madeira de outra maneira, quando pensaram em fermentar brancos na madeira nova e estagiar os tintos também em barricas acabadas de fazer. A moda pegou a partir de finais dos anos 80 e, passada a euforia, foi-se despegando, lenta mas inexoravelmente. Hoje encontramo-nos num patamar curioso e o que temos à disposição é uma enorme variedade de perfis, onde cabem as experiências, umas inovadoras outras que retomam, agora com mais saber, as práticas antigas, sempre pensando na educação do vinho. A regra em vigor actualmente poderia enunciar-se assim: para manter o perfil das castas e expressar tanto quanto possível a região de origem, as madeiras têm de ser usadas com parcimónia. As boas práticas aconselham assim que se usem barricas novas e usadas, na proporção em que cada produtor se reveja, uns preferem com mais barrica, outros menos, uns gostam de meias barricas (225 l) outros preferem 300 ou 500 e, cada vez mais, tonéis novos de 1000 litros. Estou em crer que todos ganhámos com a mudança, temos vinhos mais elegantes e com a complexidade que a madeira aporta. Hoje já temos vários produtores a ensaiarem também, sobretudo em brancos, o método de fazer um lote de vinhos de várias colheitas que estagiaram longamente em cascos. Tudo começou na quinta dos Carvalhais (então pela mão do enólogo Manuel Vieira) e hoje são vários os produtores a abraçar o método. Há riscos associados porque as madeiras usadas podem tornar-se um viveiro de bicharada e há que estar muito atento à forma como o vinho evolui e é preciso ter a coragem de recusar barricas que não evoluíram bem. Os resultados para já são animadores e o leque de escolhas é agora maior. Mesmo aqueles que optam por continuar a fermentar totalmente os mostos em madeira nova optam por barricas muito menos tostadas e que preservam o carácter da uva. Mudaram as modas e mudaram as práticas das tanoarias. Quanto ao conceito em si, tenho para mim que não há grandes tintos sem passagem na madeira, seja lá ela qual for. Brancos haverá – como muitos Alvarinho de Monção/Melgaço – mas o «namoro» entre o vinho e a madeira está para durar. Em tintos e brancos.

Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)

Zimbro 5 Marias tinto 2020
Região: Douro
Produtor: Quinta do Zimbro
Castas: cinco castas tradicionais da região
Enologia: Ana Hespanhol
PVP: €22
Vinhas no Cima Corgo. Vinificações de vários tipos em lagar e em inox. O lote final estagiou 18 meses em madeira.
Dica: muito bom o equilíbrio de conjunto, na fruta, no corpo, nos taninos; o vinho está bem desenhado e a prova é acessível e resulta muito bem. À mesa será um sucesso.

Ravasqueira Heritage branco 2019
Região: Reg. Alentejano
Produtor: Ravasqueira Vinhos
Castas: Viognier, Alvarinho, Arinto e Marsanne
Enologia: David Baverstock e Vasco Rosa Santos
PVP: €26,50
Vinificadas por casta em inox, os mostos passam depois para barrica onde terminam e estagiam por 12 meses sem mais intervenção. 3408 garrafas produzidas.
Dica: do tempo em barrica surge um branco cheio, volumoso marcado, na medida certa, pela madeira. A boa acidez equilibra o conjunto. Exige copos largos e temperatura de serviço a cerca de 12º.

Porto Quinta da Côrte LBV 2018
Região: Douro
Produtor: Pacheco & Irmãos
Castas: várias, da região
Enologia: Marta Casanova
PVP: €29,05
São aqui usadas as uvas das parcelas mais velhas da quinta, que se situa em Valença do Douro, no Cima Corgo. A quinta também dispõe de vinhos DOC Douro e azeite.
Dica: retinto e muito concentrado, um Porto que se mastiga, um prazer a beber agora com queijos secos, com chocolate ou, porque não, a solo.

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