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Acreditar na calmaria do Alentejo

Estes também precisam de descanso

Creio que existe na tertúlia de enófilos a ideia generalizada que os vinhos do Alentejo devem ser bebidos novos. As razões que se aduzem são de tipo variado e começam logo pelo facto da região ser uma zona tendencialmente muito quente, com calores abrasadores no Verão. Desses calores temos duas consequências mais ou menos inevitáveis: a subida dos açúcares nos bagos por via desse calor leva depois a vinhos mais alcoólicos; por outro lado, o calor estival faz diminuir a acidez e a consequente frescura dos mostos, obrigando os técnicos a corrigir a acidez para que o resultado final seja equilibrado. Este quadro, esquemático e algo simplista, teve a sua razão de ser e o seu tempo. Até aos anos 80 do século passado as adegas cooperativas eram praticamente os únicos operadores e os sócios tendiam a vindimar uvas brancas e tintas em simultâneo. As brancas, vindimadas mais tarde do que deviam, geravam vinhos algo pesados, com fruta demasiado madura e alcoólicos; os tintos, até pelo peso do álcool, eram vinhos gordos, muito macios e ao gosto de muitos consumidores. Muita da fama dos vinhos tintos alentejanos vem desse lado cheio e envolvente que depois se ligava muito bem com a gastronomia local. O surgimento de novas regiões na moda, como Douro, o Dão ou mesmo Bairrada e Lisboa, nunca ofuscou esse apreço do consumidor – que se mantém até hoje – pelos vinhos da planície. A verdade é que actualmente o modus operandi se alterou substancialmente e a primeira grande inovação foi a separação das vindimas. As uvas brancas passaram a ser vindimadas muito mais cedo, quando as uvas apresentam menos potencial alcoólico e mais acidez. O resultado foi o esperado: vinhos mais frescos, com muito maior expressão de fruta, menos peso e maior elegância. Desta forma algumas castas ganharam mais expressão, como Antão Vaz e Arinto, outras, como Viognier ou Alvarinho, chegaram de fora para alegrar o ambiente e, com o tempo, algumas foram perdendo protagonismo, como Roupeiro, Perrum, Rabo de Ovelha ou Tamarez. Mas a antecipação das vindimas acabou, por arrastamento, por incluir também as uvas tintas. Hoje é muito habitual ouvirmos falar em vindimas que começam em Agosto. Já menos habitual, mas fruto também das alterações climáticas, hoje sabemos de vindimas de brancos no Alentejo ainda em Julho e produtores que antes de 20 de Agosto têm toda a vindima terminada. Essa mudança de estilo também fez com que os grandes vinhos do Alentejo aprendessem a sobreviver com muita saúde à prova do tempo. É o caso dos vinhos que hoje sugiro, já esgotados na produção mas ainda disponíveis no mercado. Melhor viticultura e enologia de precisão ajudam à saúde que os vinhos apresentam. Dizer que os tintos antigos do Alentejo não sobreviviam é um exagero; há algumas boas colheitas antigas em várias cooperativas, como já tive oportunidade de comprovar em Reguengos, Borba e Vidigueira. Mas os de hoje sobreviverão, creio, com melhor perfil ao tempo em cave. Por isso, e sem ser regra, de 10 a 20 anos é o tempo de cave indicado para tintos, com toda a segurança. Os brancos, que precisarão de mais supervisão, poderão trilhar o mesmo caminho.

Sugestões da semana:
(Os preços indicados são os que constam em sites online consultados)

Pêra Manca branco 2014
Região: Alentejo
Produtor: Fundação Eugénio de Almeida
Castas: Antão Vaz e Arinto
Enologia: Pedro Baptista
PVP: €80
Parte do mosto fermentou em madeira tendo todo o lote sido sujeito a estágio sobre as borras finas e um posterior estágio em garrafa. Foram feitas 70 000 garrafas. Este vinho tem produção anual.
Dica: dourado na cor, mostra-se em muito boa forma, cheio, maduro, untuoso mas com excelente acidez. Um grande branco de Inverno.

João Portugal Ramos Estremus tinto 2011
Região: Reg. Alentejano
Produtor: J. Portugal Ramos
Castas: Alicante Bouschet e Trincadeira
Enologia: equipa dirigida por João Ramos
PVP: €90
As uvas foram pisadas a pé me lagares de mármore e tiverem uma ligeira maceração, por forma a que o vinho ganhasse em elegância. Edição limitada de 2853 garrafas.
Dica: perfeita ligação das duas castas num tinto que prima pela elegância, com aromas maduros, terrosos mas com enorme equilíbrio de conjunto.

MR Premium Touriga Nacional tinto 2012
Região: Reg. Alentejano
Produtor: Soc. Agr. Dom Diniz
Casta: Touriga Nacional
Enologia: equipa de enologia do Monte da Ravasqueira
PVP: €55
Vinhas na zona de Arraiolos. Produção de 3456 garrafas e alguns exemplares em grandes formatos. O vinho estagiou dois anos em barricas de carvalho francês e outros dois em garrafa.
Dica: uma Touriga madura, menos floral do que noutras regiões mas com muito bom diálogo entre fruta e barrica. Dá muito prazer a beber e assim irá continuar.

 

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