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Começar bem o ano

O verdadeiro enófilo é um experimentador

À medida que o vinho se vai dessacralizando e os temas com ele relacionados passam a fazer parte da linguagem corriqueira e de salão, é vulgar que, à força de querer estar in, se façam muitas afirmações a propósito e, claro, sempre com ar definitivo. Deixámos na penumbra dos tempos aqueles assuntos a que só alguns iluminados conseguiam chegar e passámos a lidar tu cá tu lá, com a botrytis, o gelo seco e a maloláctica. Ainda assim, é bom evitar pôr o pé na argola, sobretudo quando não temos a certeza do que dizemos. Alguns exemplos:
Eu só bebo… O que vamos ouvir a seguir pode ser: só branco, só tinto, só vinho do Alentejo, só Bairrada e por aí fora. A grande verdade é que esta afirmação não costuma resistir a uma prova cega; os que só gostam de alentejanos descobrem que o vinho servido é maravilhoso e, afinal, é de Trás-os-Montes, e por aí fora. Não tenhamos dúvidas: a variabilidade regional, as diferentes formas como se pode fazer vinho e o perfil que ele pode adquirir em função da personalidade do produtor, levam-nos a afirmar que há bom vinho em todas as regiões. O verdadeiro enófilo é um experimentador.
Vinhos com cápsula? Nem pensar… Num país produtor de rolhas esta afirmação tende a ter uma certa conexão patriótica. No entanto, a cápsula revelou-se uma solução de enorme valia para os vinhos que não requerem estágio em cave (a grande maioria da produção), e ela evita o famigerado cheiro a rolha. Já esteve mais em voga e, actualmente, tende a ser substituída pelas rolhas de aglomerado de cortiça mas a cápsula pode manter um vinho com grande frescura (cor e acidez) por mais de uma década. É obra!
Os brancos não são para guardar… Só quem não lê a imprensa da especialidade pode continuar a afirmar isto. As regiões que geram vinhos de boa acidez e bom teor alcoólico tendem a produzir brancos que podem viver bem 20 e mais anos, como a Bairrada, Dão, Monção e Melgaço, só para citar alguns exemplos. Em todas há que estar preparado para grandes surpresas. E até com a mesma idade, os brancos mais velhos batem-se com os tintos que, muitas vezes, têm dificuldade em revelar-se de tão boa saúde como os brancos.
Vinhos estrangeiros são uma perda de tempo… Quanto menos se conhece mais se «acha» que os vinhos portugueses são inigualáveis. O bom enófilo é aquele que quer provar tudo e que «parte para a luta» de peito aberto sem preconceitos. Umas vezes os nossos saem-se bem, outras nem por isso.
Champanhe? Só português… Em tempos (inícios do séc. XX) a frase até era aceitável já que os nossos espumantes usavam essa terminologia nos rótulos. No entanto a legislação actual é clara: Champagne é uma região produtora e só os vinhos ali produzidos se podem apelidar de Champagne. Os outros têm de ter outros nomes, como Sekt na Alemanha ou Cava em Espanha, ainda que Cava identifique uma região própria do Penedès. Por cá designamos por Espumante Método Clássico ou Tradicional, aquele que é feito seguindo o modelo da região de Champagne, ou seja, da segunda fermentação na garrafa. Mesmo que tenha origem noutra qualquer zona francesa, o espumante não se pode chamar Champagne. E bem que podemos ter o maior orgulho em alguns dos espumantes que o nosso país já produz.
(Continua)

Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)

Barão do Hospital branco 2021
Região: Monção e Melgaço
Produtor: Falua
Casta: Alvarinho
Enologia: Antonina Barbosa
PVP: €15
A propriedade, com casa senhorial, pertenceu na Idade Média à Ordem dos Hospitalários. Dispõe de 25 ha com 12 de vinha, área que será alargada em breve.
Dica: como é habitual é agora que os Alvarinhos de 2021 começam a dar boa prova mas são vinhos para 20 anos. O polimento desde 21 é notável. Excelsa qualidade a preço moderado.

Quinta de Ventozelo LOCI tinto 2020
Região: Douro
Produtor: Quinta de Ventozelo
Castas: seis castas de parcelas diferentes
Enologia: José Manuel Sousa Soares
PVP: €25
A quinta tem 400 ha, dos quais 200 são de vinha que se estende desde o rio até aos 600 m de altitude. A quinta produz também azeite, mel e frutas e tem enoturismo com hotel a funcionar. Localização privilegiada, muito perto do Pinhão. O vinho estagiou em barricas de 2º e 3º anos.
Dica: média concentração, aroma vigoroso e carregado de fruta negra e notas vegetais. Um tinto afinado, cheio e muito gastronómico.

Marquesa de Alorna Grande Reserva tinto 2016
Região: DOC do Tejo
Produtor: Quinta da Alorna
Castas: lote de cinco castas
Enologia: Martta Simões
PVP: €30
O mosto é vinificado em inox e o vinho estagia por 14 meses em barricas novas. Antes de ir para o mercado ainda fica mais um ano em garrafa. Os vinhos Alorna estão disponíveis nas grandes superfícies.
Dica: a barrica nova dá-lhe um carácter muito próprio, com notas de baunilha, tosta de madeira e fruta madura. Macio e amanteigado na boca, perfeito para consumo imediato.

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