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Estamos no tempo delas

E vamos dar-lhes uso variado

Está terminada a vindima mas é cedo para balanços. Os produtores e enólogos com quem falei são cautelosos nos comentários (como seria de esperar) e em zonas de localização muito diversa das parcelas, como é o caso do Douro, aconteceu o que aqui escrevi como previsão: algumas vinhas «escaparam» e originaram bons mostos mas houve zonas onde «a perda foi de 70%», como nos referiu um enólogo da região. Ao que parece foi assim pelo país todo, com bastantes desequilíbrios de acidez, valores estranhíssimos de pH, enfim, onde correu mal, correu tudo mal. A frase que mais se ouve agora é: vamos ver! É isso que vamos fazer, esperar, esperar e fazer votos para que no meio da confusão, tenhamos direito a vinhos agradáveis. Já não seria nada mau.
Com os dias a arrefecerem, entramos a entrar na época das castanhas. O São Martinho já vem perto e os produtores de vinhos de talha estão a contar os dias para a abertura das mesmas, que coincide exactamente com o dia do santo. Nesse dia, o vinho estará já feito e pronto a beber directamente da talha, sem mais delongas. Sempre assim foi desde tempos imemoriais: começava-se a beber no São Martinho e a duração do vinho era medida pela «cubicagem» de quem o bebia. Seguramente era vinho para alguns meses e ponto final, nem ao Verão seguinte chegava. A tradicional água-pé, um vinho cujo mosto tinha sido muito baptizado com água para lhe baixar o grau era, noutros tempos, bebida para toda a família. Hoje, sobretudo nos meios urbanos, a dita água-pé evaporou-se mas temos vinhos, ainda que com muito mais grau, que podem cumprir a função. Dois deles são sugestões de hoje: um branco da Cartuxa com algum peso, feito à moda antiga, com as películas em contacto com o mosto que é a técnica usada para fazer os tintos (curtimenta). Pode ser uma boa surpresa com as castanhas, seja na versão assada, nos tradicionais assadores de barro ou alumínio, seja na versão cozida em que se usava – dependendo do gosto regional – erva-doce para lhe conferir o gosto característico. Já o tinto Maçanita é um vinho muito aberto de cor porque resulta da mistura de uvas brancas e tintas que são vinificadas em conjunto. É um modelo de tinto que corresponde a uma tendência agora muito valorizada mas que até há poucos anos era remetida apenas para o capítulo das curiosidades. Estes tintos abertos, também chamados de palhete, são o que temos de mais próximo, em termos de cor, da antiga água-pé. Para completar o trio associativo, podemos ficar no Gorro ou nos rosés que não virarão as costas às castanhas e nos ajudam a fazer a limpeza da garrafeira. No entanto, seria injusto falar das castanhas sem referir a sua utilização culinária mais abrangente. Desde sopa, sobretudo se as castanhas forem cozidas em caldo de galinha e que, ao creme final juntamos cogumelos do campo (cantarelos, de preferência) rapidamente passados na sertã, até assados no forno em que, ao lado do cabrito e durante todo o tempo que ele assa, temos as castanhas a ganhar o sabor do bicho e do vinho que formos usando para regar a assadura. Dar uso diversificado aos vinhos de que dispomos é um bom exercício e podemos sempre surpreender os nossos convidados. Vamos a elas!

Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)

Maçanita Letra F tinto 2021
Região: Douro
Produtor: Maçanita Vinhos
Casta: cerca de 20 castas misturadas (entre brancas e tintas)
Enologia: Joana e António Maçanita
PVP: €14,90
Fermenta em pequenos lagares e estagia depois em inox durante um ano. Fizeram-se 2336 garrafas. A letra F identifica a zona do Douro menos valorizada para a produção de Porto. A letra A corresponde às melhores zonas.
Dica: da mistura de brancas e tintas surge este vinho muito aberto de cor (palhete?), suave e muito gastronómico. Bebe–se mais fresco que os restantes tintos.

Cartuxa Curtimenta branco 2017
Região: Alentejo
Produtor: Fundação Eugénio de Almeida
Castas: vinhas velhas com castas misturadas
Enologia: Pedro Baptista/Duarte Lopes
PVP: €50
O mosto fica em contacto com as películas durante todo o processo fermentativo (29 dias), resultando assim com mais cor. Um branco que reproduz os vinhos de antigamente.
Dica: cheio, muito estruturado mas com boa acidez, resulta como vinho de Inverno, polivalente à mesa (e com castanhas também).

Gorro Loureiro branco 2021
Região: Vinho Verde
Produtor: Portugal Boutique Winery
Casta: Loureiro
Enologia: Ricardo Sarrazola
PVP: €11
As uvas são do vale do Lima, de duas zonas com solos diferenciados. A fermentação e posterior estágio sobre borras é feito em cubas de inox com temperatura controlada. Resulta um branco com mais cor do que habitual.
Dica: aroma maduro de fruta citrina, com boca envolvente e macia mas com excelente acidez. Óptimo para esta época do ano.

 

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