Setúbal dá um passo em frente Tal como tinha anunciado na semana passada é hoje…
Em defesa das boas vinhas
Idade ou qualidade?
Um dos temas preferidos dos produtores de vinhos é a idade das vinhas, quando dizem, com orgulho, «o meu vinho vem de vinhas velhas». Ao afirmar isto estão a passar a mensagem que a qualidade vem da idade das vinhas e por isso merece ser referenciada. Dizer que o tema é controverso é pouco; o assunto ganhou destaque quando os produtores de uva começaram a usar e abusar do epíteto que, diga-se, fica bem em qualquer rótulo. Creio que entre nós se começou a usá-lo, timidamente, em 1988. A ideia pegou e de então para cá tem sido um fartar vilanagem. De tal forma se vulgarizou que alguns produtores começaram à procura de nomes que pudessem ser mais originais – vinha centenária, vinhas antigas, primeiras vinhas – sempre com o intuito de marcar a diferença entre os vinhos que dali saem por comparação com os das vinhas novas. Uma amostragem de grandes vinhos do mundo (os mais famosos) revela-nos que praticamente todos têm origem em vinhas velhas e não é seguramente por acaso. Há assim um denominador comum, uma espécie de postulado que nos diz que de uma vinha velha sai um grande vinho. À falta de legislação específica que caracterize o conceito de «vinha velha» (de que muito se fala mas até agora não existe), usa-se e abusa-se dele, passando uma mensagem ao comprador que não é necessariamente verdade. Vejamos: um vinho é bom por vir de vinha velha? Nim! A vinha velha produz sempre bom ou mesmo excelente vinho? Nim! É tudo nem sim nem não porque não existe uma relação directa e inequívoca entre a idade da vinha e a qualidade do vinho. A cepa, tal como os humanos, tem de nascer e ser bem-criada, protegida, alimentada e apaparicada para que o fruto seja bom. Ora isso também se consegue com uma vinha nova, de boa casta, plantada no local certo e que, bem trabalhada, pode dar vinho de grande qualidade logo ao 4º ou 5º ano, não é preciso esperar 20 ou 30. Muitos milhares de hectares de vinha se renovaram em Portugal após a entrada na Comunidade Europeia. Dizia-me um enólogo há uns anos que se fosse verdade que as vinhas velhas é que eram boas, Portugal teria nessa altura obrigação de fazer os melhores vinhos do Mundo, tal a idade e estado decrépito de muitas das cepas que foram então arrancadas! O que se pode esperar de uma vinha velha (digamos com uma idade superior a 30 anos): pouca produção (entre nós e em zonas como o Douro, Bairrada ou Portalegre por vezes baixíssima produção), grande concentração dos mostos, originalidade aromática e boa longevidade. E então, porque nem todas as vinhas velhas dão vinhos extraordinários? Porque tudo dependa da localização da cepa (solo, clima, casta e localização específica), ou seja, o tal estafado conceito de terroir. Há boas vinhas e vinhas vulgares. Com as boas (independentemente da idade) pode fazer-se um bom ou mesmo fantástico vinho; as outras obrigam a uma narrativa para enganar incautos. Sobre o tema pode consultar-se «Vinhas Velhas de Portugal», de Luis Antunes, Edição CTT.
Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)
Aldeia de Cima Reserva tinto 2019
Região: Alentejo
Produtor: Herdade Aldeia de Cima do Mendro
Castas: Trincadeira, Alfrocheiro; Alicante Bouschet e Aragonez
Enologia: António Cavalheiro/Jorge Alves
PVP: €16
O vinho estagia em 4 tipos diferentes de depósito: ânforas, barricas, tinajas e Nico Velo, correspondendo também a diferentes tempos de estágio e cada um deles. Este é o projecto de Luísa Amorim no Alentejo. 36 000 garrafas produzidas.
Dica: o vinho apresenta um excelente balanço entre fruta acidez e taninos, permitindo perfeita prova desde já. Seguramente muito polivalente à mesa, nomeadamente com borrego assado ou em ensopado.
Fonte do Ouro Reserva Especial Encruzado branco 2021
Região: Dão
Produtor: Soc. Agríc. Boas Quintas
Casta: Encruzado
Enologia: Nuno cancela de Abreu
PVP: €13,50
Esta é a variedade mais emblemática da região e uma das grandes castas brancas portuguesas. Pouco dada a viagens, tem-se mantido quase exclusivamente no Dão. Este branco fermentou e estagiou em barrica.
Dica: leve austeridade aromática, com boa definição de fruta branca. Envolvente, cheio e com óptima acidez. Um prazer à mesa.
Porto Vintage Quinta da Gricha 2020
Região: Douro
Produtor: Churchill Graham
Castas: várias
Enologia: Ricardo Nunes/John Graham
PVP: €60
A empresa editou neste ano um outro vintage com o nome Churchill. Este vintage de quinta, é feito exclusivamente em lagar com pisa a pé e corresponde a uma produção de apenas 600 caixas de 12 garrafas.
Dica: aberto de aromas (florais, entre outros), vivo e jovem, muito elegante e fresco, está a dar excelente prova agora. Um vintage para 20/30 anos.
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