E, se recuarmos muito, só paramos na Bíblia Acontece com frequência. Temos tendência a pensar…
Chegou o momento (deles)
E tudo se passa na adega
Com a vindima a decorrer, a condução do processo deixou a vinha e passou para a adega. No fundo, após a chegada das uvas à adega já nada importa nas cepas e na vinha; agora é aqui que tudo se resolve e os enólogos pegam ao serviço. A primeira tarefa é ter uma noção do estado sanitário das uvas e para isso é preciso escolher: separar as podres, retirar as que estiverem totalmente secas e mesmo muitas das que estiverem em passa. As secas não adiantam nada e as que chegam em passa poderão fazer aumentar em excesso o teor de álcool do vinho. Do estado sanitário podemos logo tirar algumas conclusões sobre o que esperar delas. Mas quem apenas observar os bagos pode ficar com uma ideia errada (ou no mínimo incompleta) sobre a qualidade. É preciso analisar para se ter uma noção dos teores de açúcar, do álcool provável e do pH e, em anos estranhos como este, os bagos até podem ter bom aspecto mas têm pouco sumo devido à seca extrema, logo, temos diminuição da produção no horizonte. Depois há que fazer escolhas em função destas primeiras análises: se for branco vai fermentar para cuba ou para barrica nova? A decisão é muito onerosa (no caso das barricas) e por isso há que escolher bem as uvas. Na cuba ou nas barricas é bom que se controle a temperatura da fermentação – uma das grandes, grandes inovações da enologia dos últimos 50 anos – para que os aromas não se percam. Espera-se que tudo corra bem mas, se a fermentação não arrancar ou parar a meio, é bom que se usem leveduras seleccionadas para o efeito. Para uns elas são um papão mas, para outros mais pragmáticos, são apenas uma ferramenta para que tudo decorra como é suposto. Acompanhar a fermentação e estar atento ao evoluir da mesma é algo que a moderna tecnologia permite; deixar tudo ao Deus dará pode dar muito mau resultado. A ideia peregrina de que o vinho se faz por si é das maiores aberrações que nos têm tentado impingir nos tempos mais recentes. Com a liberdade toda, o mosto caminha inexoravelmente para vinagre. Até pode não ser logo mas durará apenas alguns meses em garrafa, sobretudo se não se usar o mais poderoso conservante que se conhece desde os tempos dos romanos: o anidrido sulfuroso, o «fantasma» do contém sulfitos que surge nos contra rótulos das garrafas. Mas até chegar à garrafa muito ainda se exige ao enólogo: escolher lotes, decidir sobre que tintos vão para o estágio em madeira (e de que tipo, nova, usada, etc…) quanto tempo lá ficam e depois fazer lotes, ensaiar até à exaustão combinações diferentes para se conseguir qualidade, equilíbrio e expressão do local. Este é um verdadeiro mantra que todos procuram: a expressão do terroir. Consegui-lo é que não é fácil porque para isso é preciso fazer a zonagem das vinhas e perceber que casta ou castas melhor representam e espelham o que se esconde no solo. No final até podemos ter vinhos muito diferentes, ensaios de tudo e mais alguma coisa, desde os brancos feitos de uvas tintas até tintos do Douro com 10% de álcool ou alentejanos com 17. As derivações são isso mesmo mas, por favor, não nos queiram fazer passar ensaios e maluquices por «intervenção mínima» e expressões do terroir. Já não há paciência…
Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)
Quinta de Ventozelo Rabigato branco 2021
Região: Douro
Produtor: Quinta de Ventozelo
Casta: Rabigato
Enologia: José Manuel Sousa Soares
PVP: €12
A quinta, de grande dimensão, situa-se pouco acima do Pinhão, na margem sul do Douro. O portefólio é muito alargado e inclui também Vinho do Porto. Este branco tem uns ajuizados 12% de álcool.
Dica: muitas notas de flores brancas, ambiente fresco e onde alguns citrinos também marcam presença. Bom equilíbrio na boca, um branco polivalente para pratos ligeiros.
Quinta de Camarate branco seco 2021
Região: Pen. Setúbal
Produtor: José Maria da Fonseca
Castas: Alvarinho e Verdelho
Enologia: equipa de enologia da J. M. Fonseca
PVP: €7,99
Esta é uma das marcas clássicas da empresa, com seis décadas de existência. A composição das castas tem mudado ao longo do tempo. Chama-se branco seco porque, com o mesmo nome, existe um branco doce.
Dica: fruta madura, boa frescura ácida, com algum peso e personalidade. Tudo bons sinais, um branco que não passa despercebido.
Andeza Reserva tinto 2019
Região: Douro
Produtor: Lua Cheia – Saven
Castas: Touriga Francesa, Touriga Nacional e Tinta Roriz (maioritárias)
Enologia: Francisco Baptista
PVP: €7,15
As uvas provêm das três sub-regiões do Douro, com perfis diferenciados em termos de maturação. Após a fermentação, cerca de 70% do vinho estagiou em barrica usada.
Dica: muito bem no aroma, sedutor na fruta viva, fresco e com alguns florais. Muito macio e afinado, dá boa prova desde já. Sucesso garantido.
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