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Será bom ouvir as velhas

Sorte madrasta, a nossa

As notícias sobre a seca são assustadoras. Já não dizem respeito apenas a Portugal, antes todo o sul da Europa está a debater-se com o problema gravíssimo da falta de água. Por cá todos assobiam para o lado quando se fala do que deveriam ser duas prioridades absolutas: empresas de dessalinização de água do mar e condutas de transvase de água de umas barragens para outras. Nomeadamente no sul do país (o Douro ainda tem a água do rio…) a situação pode agravar-se de tal forma que, quando faltar a água do Alqueva para rega, a extensão enorme de olivais intensivos e amendoais pode morrer…em 15 dias. Então, e no que respeita ao vinho, o que nos podem ensinar as vinhas velhas em períodos de seca tão intensa? A verdade é que têm muito que contar e a lição será mais bem aprendida nas vinhas que têm muitas castas misturadas. É ali que, observando cepa a cepa, nos vamos aperceber de quais as variedades que têm maior resistência à seca, quais as que geram um ambiente foliar mais protector e, por via disso, as que podem ter algum futuro quando a água rarear. Mas não chega olhar para a cepa, é preciso saber o que está lá por baixo. Aí podemos encontrar soluções ou um montão de problemas. Acontece que, por via da permanência da filoxera no solo, temos de continuar a usar os porta-enxertos, o «cavalo» onde se vai depois enxertar a casta que queremos. O que torna a coisa mais difícil é que porta-enxertos há muitos, uns que induzem muita produção, outros pouca, uns são resistentes à seca, outros não e por aí fora. Conclui-se assim que é no diálogo porta-enxerto-casta que temos de encontrar o modelo que nos permita enfrentar o futuro com algum ânimo. Ao lado destas questões vitícolas sobram outras, climáticas, como já temos falado algumas vezes. Com este ambiente adverso, não nos resta muito mais que não seja subir a montanha, à procura de ares frescos que nos permitam fazer vinhos de boa acidez, elegantes e atractivos. Em Portugal já temos algumas vinhas acima dos 1000 metros, algo impensável há uns anos. A vinha era uma planta de climas mediterrânicos, agradecia calor para amadurecer as uvas mas queria «sol na eira e chuva no nabal». Ora as alterações climáticas estão pouco para aí viradas e temos de nos adaptar. Vamos ficar sem vinho? Não! Temos mesmo de nos preocupar? Temos, não só nós como os franceses, os italianos, os gregos e os outros países da bacia do Mediterrâneo. Não faltará muito para que a Dinamarca, a Noruega e a Suécia descubram o novo maná que vai ser a produção de vinho. A seguir vem a Escócia e depois a Islândia e a Sibéria, quem sabe… Se fizermos alguma coisa para contrariar a falta de água estamos safos mas se nos limitarmos a criar uma comissão que irá reflectir sobre o assunto, já sabemos que o tema terá as mesmas incógnitas que a localização do aeroporto: não há municípios que queiram empresas de dessalinização, tal como outros não querem minas de lítio. E, para agradar a gregos e troianos, lá vamos, cantando e rindo, assobiando para o lado.

Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)

Esporão Reserva branco 2021
Região: Alentejo
Produtor: Esporão
Castas: Antão Vaz, Arinto e Roupeiro
Enologia: Sandra Alves/João Ramos
PVP: €17
Toda a herdade do Esporão está em produção bio. Cerca de 25% do mosto fermentou em barrica e todo o vinho estagiou 6 meses na madeira. Tem sempre uma inesperada capacidade para viver bem em cave.
Dica: grande clássico desta empresa, sempre muito atractivo no balanço perfeito entre fruta, acidez e madeira. Absolutamente consensual.

Aveleda Loureiro branco 2021
Região: Vinho Verde
Produtor: Aveleda
Casta: Loureiro
Enologia: Fábio Giroto Maravilha/Valérie Lavigne
PVP: €4,99
Vinhas em solos graníticos e arenosos. Fermentação em inox, contacto com as borras em suspensão. Ajuizada graduação (11,5%) e 8 gr/açúcar por litro que em nada prejudica o vinho, antes o amacia.
Dica: muito expressivo na fruta, muito fácil de gostar, fresco e citrino. Redondo e muito afinado no palato, dá boa prova e recomenda-se vivamente.

Quinta do Estanho Reserva tinto 2018
Região: Douro
Produtor: Quinta do Estanho
Castas: Touriga Nacional, Touriga Francesa e Tinta Roriz
Enologia: Luis Leocádio
PVP: €19,90
As uvas provêm do vale do rio Pinhão. Após a vinificação, cerca de 50% do vinho teve um estágio de 12 meses em barricas. Este produtor também tem, no portefólio, Vinho do Porto de todas as categorias.
Dica: muito afinado, com grande polimento na prova de boca, temos tinto acessível no perfil e seguramente muito polivalente à mesa.

This Post Has 2 Comments

  1. É sempre um prazer ler as críticas e o ensinado vitivinícola do mestre entendido e sempre alegre; João Paulo Martins.
    Obrigado mais uma vez

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