Dizer que temos uma garrafa em casa não chega Um dos vinhos que seleccionei esta…
É verdade, são do Douro Lorosae
E do deserto nasce o vinho
Houve tempos, não tão longínquos assim (anos 50 e 60 do século passado) em que uma ida ao Douro era um pesadelo, sobretudo para quem trabalhava em Gaia e vivia no Porto. Por essas e por outras os homens do Vinho do Porto limitavam ao máximo as suas deslocações: estradas de terra, sem condições ou locais onde ficar e onde comer, sobretudo se o destino ficava muito afastado da linha férrea. E se se falasse em Foz Côa, então era mesmo o Douro Lorosae. Alguns visionários foi aí que procuraram aventurar-se, como Dona Antónia na quinta do Vale Meão e alguns outros. Ainda há 30 anos havia muita terra disponível, uma vez que nem todos acreditavam que dali, terra árida e sem chuva, poderiam sair bons vinhos. Tudo mudou de então para cá e, terra que esteja perto do rio e de onde se possa captar água, já há pouca, sobretudo na margem sul. A secura da região tem vantagens, com pouca incidência de doenças da vinha, o que favorece a agricultura bio mas praticamente obriga a que se instale a rega na vinha, sob pena da rentabilidade do negócio ser demasiado baixa, logo, inviável. Hoje trago três vinhos do Douro Superior, não longe de Foz Côa. São três magníficos tintos, de três projectos que não têm tantos anos assim mas que se impuseram como referências. Muitos outros poderiam aqui ser referidos, tal a apetência que a região tem agora junto dos produtores. Se o assunto for Vinho do Porto, há um largo consenso que é na zona central da região – o Cima Corgo – que nascem os melhores vinhos e que a zona mais a oeste- Baixo Corgo – está vocacionada para vinhos de consumo e vinhos do Porto das gamas não superiores. Vinho do Porto no Douro Superior? Sim, há, mas muitos torcem o nariz…. No entanto, com o crescimento que os vinhos DOC Douro têm tido, a procura tem sido muito grande, há muito investimento estrangeiro, há quintas a mudar de mãos e há uma nítida concentração de propriedades nos principais grupos produtores. Para o pequeno investidor, ou pequeno agricultor, poucas são as esperanças de conseguir um negócio que seja rentável: a uva paga-se mal, há vinho a mais, há marcas a mais no mercado, há um esmagamento de margens nas grandes superfícies. Para tudo piorar, os designativos de qualidade não querem dizer nada quando um Grande Reserva custa €4 num super. No fim da linha há muito pouca disponibilidade das grandes empresas para alterar o status quo e «A Questão do Douro» é tema há 150 anos. E este ano, com a dificuldade do fornecimento dos «secos» (garrafas, caixas, cápsulas, rótulos) quem é pequenino está em muito maus lençóis. Todos gostamos dos vinhos dos pequenos produtores mas poucos são os que conseguem vender aos preços que, esta semana, aqui refiro. Há vinhos muito caros no Douro mas não haverá muitos que se vendam ou que os compradores repitam a compra. Por isso, não fiquemos deslumbrados quando os vemos muito caros nas prateleiras. Com alguma informação, podemos estar certos que, nomeadamente em Foz Côa e arredores, há muito por onde escolher, há bons projectos e vinhos de alta qualidade. Afastados da ribalta, os vinhos da zona, em tempos chamada Douro Lorosae por quem vivia no Porto, é um tesouro. Alguns já descobriram o mapa da mina mas a maioria, não.
Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)
Quinta do Monte Xisto tinto 2019
Região: Douro
Produtor: João Nicolau de Almeida & Filhos
Castas: Touriga Nacional, Touriga Francesa e 5% Sousão
Enologia: em família
PVP: €60
Este é um projecto familiar, do João (pai) e dos três filhos, dois deles também enólogos. Na quinta têm-se ensaiado novos métodos de viticultura, o que os aproxima da bio-dinâmica. 7 000 garrafas produzidas.
Dica: belíssima expressão do Douro Superior, fruta no estado puro e elegância de conjunto absolutamente notável. Requintado e moderno sem esquecer as práticas antigas.
Callabriga tinto 2019
Região: Douro
Produtor: Sogrape Vinhos
Castas: Touriga Francesa, Touriga Nacional e Tinta Roriz
Enologia: equipa dirigida por Luis Sottomayor
PVP: €18,50
As uvas que entram neste vinho são da quinta da Leda e outras vinhas vizinhas. Dele produziram-se 98 344 garrafas. Também existe em formatos grandes. Tem um estágio de 12 meses em barrica, 75% usada.
Dica: este tinto tem sempre uma óptima relação qualidade/preço. E têm sido grandes as surpresas com provas feitas 10 anos a seguir à colheita, sobretudo em magnum. Muito equilíbrio, perfeita ligação fruta/madeira. Um prazer.
Quinta da Touriga Chã tinto 2019
Região: Douro
Produtor: Jorge Rosas
Castas: Touriga Nacional e 23% de Touriga Francesa
Enologia: João Brito e Cunha/José Luis Silva
PVP: €60
Este é um dos grandes tintos do Douro, com uma consistência notável ano após ano. Muito cobiçado, tende a ser difícil de comprar. Mas vale o esforço. Tem 15 meses de estágio em barrica, 63% nova.
Dica: Touriga no seu melhor estilo, onde se descobre a região atrás da casta, maduro mas não quente, muito rico e elegante.
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