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Vamos pagar a factura

E vai doer, assim dita a guerra e o resto

Estamos numa época do ano em que muitos vinhos são engarrafados. Alguns já estarão mesmo no mercado, sobretudo as colheitas que são pensadas para serem consumidas muito jovens. Os vinhos com mais estágio, quer de barrica quer de garrafa, deveriam começar a ser embotelhados nesta época do ano, digamos até Julho. Digo «deveriam começar» porque não é seguro que assim seja, face à caótica situação de falta de equipamentos que actualmente atravessamos. É quase difícil descobrir um item ligado ao vinho que não tenha problemas de fornecimento de materiais. Começa na construção civil em que algumas adegas que estão em construção se debatem com falta de ferro e outros materiais indispensáveis. Negoceia-se hoje e o orçamente tem validade curta. O mais curto que já me chegou aos ouvidos era um orçamento válido até às 24 horas do próprio dia. Quer engarrafar? Mas onde estão as garrafas? Tem a certeza que chegam a tempo e nas quantidades pretendidas? E as cápsulas? E as caixas? De madeira? Era bom, era. De cartão? Talvez mas os fornecedores não asseguram. O desespero grassa e é nestas alturas que percebemos que levámos longe demais a ideia da globalização. Percebemos agora que, apressadamente, assumimos que os potenciais fornecedores dos bens que precisamos para a nossa actividade estavam dispersos por uma miríade de países e que tal funcionaria eternamente sem problemas. Sempre à procura dos melhores preços, até nos produtos alimentares começámos a importar o que sempre produzimos; nem o grão nem o feijão escapam, uns vêm do México outros do Canadá, os espargos do Peru, a carne dos sítios mais diversos. É muito bonito enquanto tudo funciona e a máquina está oleada, mas, de repente, percebemos que exagerámos. Até no papel, e é sabido que somos produtores de pasta, há dificuldades, uma vez que é feito na Suécia e nos chega via Espanha. Quer fazer um livro? É bom que encomende o papel com 4 a 5 meses de antecedência, e mesmo assim não é seguro. Costuma perguntar o povão: mas quem é que quer ser prior nesta freguesia? Nesta fase, o bom-senso aconselharia a que a velha querela novecentista entre Livre-Câmbio e Proteccionismo, que fez correr rios de tinta entre economistas, se voltasse a pôr em cima da mesa. Dito por outras palavras, proteger a produção nacional mesmo que aqui e ali resulte mais caro, ou seja, um mini proteccionismo «à sec. XXI». Com a inflação a bater-nos à porta e os custos a subirem, não há como evitar a subida do preço final do vinho. Mas (e há sempre um mas …), quem tem as adegas cheias de vinho vai continuar a colocá-lo no mercado a preços que são um insulto. E assim se vai matando a produção nacional. E vivam as grandes superfícies que gostam de anunciar que estão a proteger os nossos produtos. Aqui não há santos de um lado e pecadores do outro; neste negócio todas as grandes empresas navegam neste barco demolidor. Estou em crer que vai metendo água e que muitos não vão sobreviver, por não saberem nadar.

Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)

Espumante Quinta dos Abibes rosé 2020
Região: Bairrada
Produtor: Quinta dos Abibes
Casta: Baga
Enologia: Francisco Batel Marques
PVP: €13,50
O vinho estagia um ano sobre as borras e mais 3 meses em garrafa. A cor ligeira deriva da pouca maceração da casta Baga.
Dica: bastante delicado no aroma, pode ser perfeito companheiro de leves acepipes, sobretudo se contemplarem peixes fumados ou peixe em sashimi.

Falua Reserva Unoaked branco 2019
Região: Reg. Tejo
Produtor: Falua
Casta: Fernão Pires
Enologia: Antonina Barbosa
PVP: €14,50
Produção de 4000 garrafas, feito com uvas da Vinha do Convento. Estagiou um ano em inox sobre borras finas.
Dica: resultou complexo, cheio mas sem pesar no palato e com grande vivacidade ácida. Um magnífico exemplar desta casta-rainha do Tejo.

Real Companhia Velha Séries tinto 2018
Região: Douro
Produtor: Real Companhia Velha (RCV)
Casta: Malvasia Preta
Enologia: Jorge Moreira
PVP: €22
Séries é uma colecção de vinhos onde têm lugar castas antigas que a RCV está a recuperar nas suas quintas. Além desta existem na colecção: Branco Gouvães, Donzelinho branco, Moscatel Ottonel e Samarrinho. Nos tintos, Bastardo, Cornifesto e Rufete, só para citar as menos conhecidas.
Dica: aberto na cor e de pouca concentração, vivo na fruta. É um prazer à mesa, sobretudo com pratos pouco temperados. A lembrar longinquamente um Pinot Noir.

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