Setúbal dá um passo em frente Tal como tinha anunciado na semana passada é hoje…
A história 40 anos depois
Soalheiro – uma família, muitos projectos
No princípio tudo se passava na garagem: algumas (poucas) cubas de inox, nada de barricas, nada de equipamento sofisticado, só o indispensável. Era assim quando visitei Soalheiro, o produtor que, pela primeira vez, lançou no mercado um Alvarinho de Melgaço. Já então existiam algumas marcas de Monção como Cêpa Velha, Brejoeira e Adega Cooperativa. Estávamos então em finais dos anos 80 e o vinho tinha nascido em Março de 1982, fez agora quatro décadas. Durante muito tempo o único local de Lisboa onde era possível provar o Soalheiro era no restaurante Gambrinus, casa que só alguns podiam frequentar. De então para cá aconteceu de tudo, desde a morte súbita do pai até à continuação do projecto pela mulher e dois filhos, António Luis Cerdeira e Maria João. O crescimento, lento mas seguro, originou o alargamento do portefólio e a diversificação dos projectos que hoje incluem a comercialização de tisanas e a produção de charcutaria feita a partir de carnes de porco bísaro. Da garagem passou-se a uma adega moderna e ampla, bem visível da estrada e a empresa, do núcleo duro familiar, alargou-se aos actuais 40 funcionários. Muitas uvas são compradas aos 150 lavradores que têm contrato com o Soalheiro. E, passados 40 anos, da garagem saltou-se para o mundo e para, pelo menos, um milhão de garrafas. O «pelo menos» aqui prende-se com a relutância habitual dos produtores em dizerem quanto produzem. A uva de Alvarinho é a mais cara do país mas António Luis, o enólogo, é peremptório, «pagamos pela qualidade, não pelo grau, e nós é que damos as indicações precisas dos momentos de vindima». Com o preço da uva a rondar €1 por quilo, e por vezes mais, percebe-se que os lavradores não só tenham todos os cuidados na produção como sejam exigentes na vindima. A casta produz bem e ser apenas produtor de uva já pode ser uma excelente fonte de rendimento. Durante as primeiras décadas apenas se fez aqui vinho em inox. Foi um desses que levei para um jantar com o realizador de cinema Jonathan Nossiter, controverso autor do filme/livro Mondovino, certo que (eu) estava do gosto dele por vinhos menos óbvios. Creio que teremos provado um Soalheiro dos anos 80 e estávamos nós no início deste século. A reacção dele, sempre espalhafatosa, foi de quase se pôr de joelhos a agradecer a Deus ter provado tal néctar. Azar o dele morar no Rio de Janeiro, nós por cá, mesmo pecadores e sem encomendar a alma ao Criador, temos tido benesses dessas com mais frequência. As mais recentes foram justamente agora nas comemorações das quatro décadas. O portefólio inclui espumante (cada vez em mais quantidade), alvarinhos de várias origens, solos e exposições, vinhos de estágio em barrica, em barro, em talha, tintos e aguardentes. As experiências continuam, o enoturismo vai ainda crescer e as tisanas e enchidos têm sido um sucesso. Tudo isto sem que a loucura dos preços aqui tenha chegado. Este exemplo bem que podia ser seguido e visto com atenção pelos que acham que o sucesso cai do céu, bastando, para isso, colocar o vinho a preços demenciais. Ganhem juízo…!
Sugestões da semana:
(Os preços foram indicados pelos produtores)
Soalheiro Granit branco 2021
Região: Monção e Melgaço
Produtor: Soalheiro
Casta: Alvarinho
Enologia: equipa dirigida por António Luis Cerdeira
PVP: €14
Tem origem em vinhas com altitude de 400 metros, destacando-se assim o lado mineral em detrimento do frutado, mais evidente nas vinhas junto ao rio. Vinificado em inox com estágio sobre as borras finas.
Dica: a provar agora e a guardar porque viverá bem até 20 anos em cave.
Morgado de Silgueiros branco 2019
Região: Dão
Produtor: Adega Coop. Silgueiros
Casta: Encruzado
Enologia:
PVP: €6
Este é um branco sedutor, onde as virtudes da casta zzz Encruzado se evidenciam. O tempo que leva de vida ajuda à complexidade do vinho. Excelente na relação qualidade/preço.
Dica: pronto a ser consumido, um branco polivalente para peixes e carnes brancas.
Esporão Reserva tinto 2019
Região: Alentejo
Produtor: Esporão
Castas: sete variedades
Enologia: Sandra Alves/David Baverstock
PVP: €20
Agricultura bio; vindima por casta, fermentação em vários tipos de depósito. O estágio estendeu-se por 12 meses. Esta foi a primeira marca do Esporão, em 1985.
Dica: um verdeiro porto de abrigo em momentos de dúvida, sempre num balanço perfeito entre concentração de aromas com fruta, notas vegetais e de especiarias. Aveludado, muito envolvente. Grande amigo da mesa.
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