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Outonos secos, vinhos doces

Está na hora de voltar a vinha

Estamos no início de Novembro e ainda há produtores preocupados com a vindima. Não com as uvas para fazer os vinhos habituais mas com as uvas que propositadamente foram deixadas na vinha. O objectivo é simples, ainda que nem sempre atingido: fazer vinhos com uvas mais doces, muitas delas em passa, originando um perfil muito diferente dos outros brancos. Digo brancos porque são por norma as uvas brancas que se deixam a amadurecer na vinha. No título falei de outonos secos porque, exactamente, sem chuva é provável que as uvas percam naturalmente o sumo, mirrem e concentrem muito o açúcar e os ácidos. Caso tivesse chovido muito em Outubro as uvas tinham apodrecido e bastava então chegar ao pé da videira para já se sentir o cheio azedo. A essa (a tal que ninguém quer ou procura) chama-se a podridão cinzenta mas há outra que pode surgir nos bagos (que à vista desarmada também parecem irremediavelmente podres) e que se apelida de podridão nobre, gerada por um fungo que é depois responsável por aromas específicos destes vinhos. Uns chamam-lhe Colheita Tardia, outros Late Harvest. Nem todos são feitos com uvas atacadas da tal podridão nobre mas não é por isso que deixam de ter direito ao epíteto. Os mais famosos vinhos deste tipo são os Sauternes (sul de Bordéus, sobressaindo aí o Château d’Yquem), os vinhos da região húngara de Tokaji mas também outros menos badalados como Qarts-de-Chaume (Loire) ou Vendages Tardives (Alsácia). Uma das variedades mais usadas em Sauternes é a Sémillon mas podem usar-se outras, assim o clima o permita. Quando estas uvas chegam à adega vêm com um potencial alcoólico enorme em virtude dos teores de açúcar que apresentam. A fermentação é feita até ao momento desejado e depois é parada com frio e/ou com sulfuroso e, por isso, o vinho fica doce. Os de Sauternes (há para todos os preços) são, nos melhores exemplos, vinhos sublimes de enorme concentração e que podem durar 200 anos. Costuma-se dizer-se que no Château d’Yquem cada cepa só produz o equivalente a um cálice. Não tenho a certeza que seja mesmo assim mas já dá a medida da concentração e pouca produção que se consegue. A vindima é feita bago a bago e só os que estão atacados com o fungo são apanhados. Os outros ficam na cepa para a passagem seguinte. Diz-se também que naquele Château chegam-se a passar 12 vezes na mesma cepa para se ir vindimando só o que se pretende. Caro? Talvez (€371 a colheita de 2008 na Garraf. Nacional, Lisboa), mas é experiência que vale a pena. Por cá também os temos bons e hoje seleccionei alguns menos falados. O nosso mais famoso será o Grandjó mas este Aneto (e também na versão Aneto S) é um belo exemplar da casta. São vinhos para queijos como Stilton ou uma terrina de foie-gras. Actualmente produzem-se, entre nós, em muitas regiões com qualidade e complexidade muito variada. Têm a vantagem do preço bem convidativo. Uma meia garrafa dá seguramente para 6 pessoas, uma vez que, por causa da doçura, se consome pouco vinho. Uma garrafa normal servirá bem 10 pessoas.

Sugestões da semana:
(Os preços, meramente indicativos, correspondem a valores de mercado)

Marquês de Borba Late Harvest branco 2017
Região: Alentejo
Produtor: João Portugal Ramos
Casta: Arinto
Enologia: João Portugal Ramos
PVP: €22
As uvas são congeladas previamente (crio-extracção), concentrando-se assim os açucares. Vinificado em inox e estagiado depois 24 meses em barricas.
Dica: resulta com 12% álcool. Macio, doce e de boa frescura ácida, temos vinho para sobremesas não muito doces como cheesecake, por exemplo.

Apartado 1 Colheita Tardia branco 2016
Região: Beira Atlântico
Produtor: Caves São João
Castas: Sémillon (65%) e Alvarinho
Enologia: José Carvalheira
PVP: €18
A zona da Bairrada não é das mais fácies para produzir este tipo de vinho em virtude das chuvas do equinócio. Por isso apenas sai ocasionalmente.
Dica: vigoroso nas notas da podridão nobre, é um vinho de muito boa harmonia, doce mas ácido, que será perfeito com foie-gras. Tem 15% de álcool.

Aneto Colheita Tardia branco 2015
Região: Douro
Produtor: Sobredos
Casta: Sémillon
Enologia: Francisco Montenegro
PVP: €15 (garrafa de 37,5 cl)
Há vários anos que este produtor vem colocando no mercado vinhos deste tipo sempre com enorme qualidade. A casta, no Douro, chama-se Boal.
Dica: rico em doçura mas com acidez perfeita, é vinho para sobremesa com queijo azul ou para entrada com foie-gras.

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