Já é possível algum balanço da vindima de 24 À hora desta crónica “vir a…
Nós e os outros
Uma história de desencontro de sabores
Estive há uma semana em Évora a participar como júri no concurso promovido pela Confraria dos Enófilos do Alentejo. Neste tipo de eventos é habitual incluir jurados que têm origens profissionais diferentes, desde logo enólogos (sobretudo da região) mas também gente da crítica, da restauração ou que esteja, de uma forma ou outra ligada ao tema do vinho. Neste caso os enólogos convidados eram da região embora, como se sabe, seja habitual terem avenças com produtores que ficam noutras regiões. Várias mesas, cinco provadores por mesa, prova cega – não sabemos de quem é o vinho que estamos a provar – e discussão entre o júri no final de cada vinho para afinar os critérios. É mesmo assim que tem de ser. A ideia pateta de que cada um dá a nota que lhe apetece sem se explicar (o que acontece normalmente nos concursos internacionais) leva a resultados muito distorcidos e sem credibilidade. Na minha mesa havia, ainda bem, bastante sintonia mas levantou-se uma questão curiosa: o que era um vinho muito bom para o júri, poderia não ser, nem de perto, um grande vinho para o consumidor. E, ao invés, vinhos que foram aqui penalizados – por excesso de madeira, por exemplo, – fariam as delícias de muitos apreciadores de tintos alentejanos. É verdade que narizes mais trabalhados não deixam passar pequenos defeitos a que nenhum consumidor chegaria mas é também verdade que existe um enorme vazio por preencher entre o gosto do público e o gosto dos críticos. Quando o consumidor quer concentração já andam os enólogos e críticos a pensar em menor graduação, menos cor e mais leveza; quando quem compra gosta de rosés com boa cor, já quem os faz anda a produzir vinhos cada vez mais descorados e de baixa graduação; e quando o consumidor já se habituou e gosta dos brancos com madeira nova, quem produz já optou pelas barricas usadas em detrimento das novas, já eliminou a tosta forte, já se deixou das meias barricas e optou por volumes maiores. Há assim uma certa distância entre quem critica e quem lê a crítica. É verdade que os sommeliers (escanções, na designação antiga…) também são influenciadores e criam gostos na sua relação com o cliente. Há mesmo algumas tendências – como é o caso dos chamados “vinhos naturais” – em que o círculo de apreciadores se aperta muito entre os produtores, alguma crítica e alguma sommelerie. São poucos, são aguerridos, fazem muito barulho mas deixam um fosso ainda maior entre quem faz e quem compra. Diz-se que esta é a função dos fazedores de opinião: sugerem caminhos, estão atentos às novidades e andam sempre um pouco adiante do consumidor, muitas vezes pontuando mal o que o consumidor gosta e dando boa nota a algo que não vai ao gosto do público. Os gostos vão mudando (e o dos críticos também) mas, independentemente das épocas e das tendências é o bom gosto e bom senso que devem prevalecer. Se assim não for, os concursos não servem para nada e a crítica pode dedicar-se à pesca.
Sugestões da semana:
(Os preços, meramente indicativos, correspondem a valores de mercado)
Dona Matilde branco 2019
Região: Douro
Produtor: Quinta D. Matilde
Castas: Arinto, Viosinho, Gouveio e Rabigato
Enologia: João Pissarra
PVP: €9
A quinta, que já surgia no mapa da primeira demarcação da região, fica entre a Régua e o Pinhão. Pertence à família Barros desde os inícios do séc. XX. Esta é a 12ª edição deste branco.
Dica: branco muito equilibrado, moderno no estilo mas muito fiel à paisagem e ao clima do Douro. Intensamente gastronómico.
Conde Vimioso Sommelier Edition tinto 2017
Região: Reg. Tejo
Produtor: Falua
Castas: Aragonez, Cabernet Sauvignon, Petit Verdot, Syrah
Enologia: Antonina Barbosa
PVP: €7,90
Nasce em terrenos arenosos, fermenta em inox e estagia em barrica usada durante 12 meses. 60 000 garrafas. Há já muitos anos que esta é uma marca de referência da região.
Dica: muito boa harmonia, a mostrar polivalência para a mesa, sem arestas. Um tinto a todos os títulos consensual.
Casir dos Santos Gran Corte tinto 2014
Região: Mendoza (Argentina)
Produtor: Casir dos Santos (Distrib: Black Pepper & Basil)
Castas: Malbec (80%) e Cabernet Sauvignon
PVP: €32,25
A Malbec é a casta tinta mais representativa dos vinhos daquele país e a ligação com Cabernet funciona especialmente bem. Concentração e estrutura mas sem perder o equilíbrio.
Dica: grande amigo dos assados de ar livre, churrasco de boi (picanha, costeleta).
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