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Milhões de garrafas e alguns dólares

Aqui há negócio e a sério…

Há alguns anos a publicação americana Wine Spectator – a mais influente revista de vinhos do país – dedicou um número especial às pechinchas, vinhos com preços baixos, provados e testados pela equipa da revista. A capa intitulava-se Bargains under $10 e lá encontrávamos o nome do vinho, do produtor, a variedade (muitos deles eram de uma só casta) e a quantidade produzida. A selecção tinha sido muito ampla e ia desde vinhos que apenas se encontravam na adega do produtor até outros que se poderiam encontrar em todo o país, exceptuando aquelas localidades que não reconheceram o fim da lei seca, decretado em 1933 (e que são em muito maior número do que imaginamos…). Na listagem dos vinhos chamou-me a atenção um deles: Fetzer Chardonnay a $7. Na coluna da direita vinha então a quantidade produzida: 1 milhão de caixas, ou seja, 12 milhões de garrafas! O número é de um absurdo total, era como se, por exemplo, a região da Bairrada não fizesse outra coisa que não fosse produzir este branco e, mesmo assim, ainda não chegava. O negócio do vinho precisa de escala para ser rentável. Estamos de acordo que não precisa de ser uma escala desta dimensão mas a verdade é que não nos podemos entusiasmar demasiado porque, ah e tal, um produtor fez 1000 garrafas de um vinho extraordinário que quer vender caríssimo ou o outro produtor que resolveu engarrafar uma barrica apenas. Tudo isso são floreados, não representam nada e não nos levam a qualquer lugar, sobretudo porque não são vendáveis no mercado externo. Ninguém pode pensar em exportar se, depois, não tem vinho para responder às encomendas. Esta questão foi-me suscitada por um dos vinhos que seleccionei hoje, o Quinta do Crasto Vinhas Velhas. Neste tinto há duas características a salientar: é produzido em quantidades inabituais (mais de 100 000 garrafas em muitas das edições e 90 000 nesta) sobretudo se tivermos em atenção o PVP que, com variações conforme o local de compra, deverá rondar os €29. Naturalmente que o vinho não se iniciou no mercado com estes volumes nem estes preços mas isto demonstra que o negócio pode, sobretudo se se conseguir manter a qualidade ano após ano, atingir valores desta ordem. Dir-se-á que o tal Fetzer (empresa gigante no EUA) é um vinho tipo caldo Knorr que tenderá a ser sempre rigorosamente igual, um vinho que dispensa notas de prova porque já se sabe ao que sabe e cheira. Será verdade, mas não tenhamos ilusões, a esmagadora maioria dos consumidores prefere ter vinhos-âncora que sabe que são sempre bons do que outros que, ainda que originais, ora estão bons, ora oxidam ao fim de algum tempo, ora têm defeitos e com os quais nunca sabemos o que contamos. É claro que gostamos de coisas originais, é claro que preferimos os vinhos que nos contam histórias mas os que bebem os Fetzer deste mundo não podem ser ignorados, por sobranceria. Palmas ao Crasto que o vinho mantém uma consistência notável. É caro? Será, mas dividida a conta por vários convivas dói menos e o prazer mantém-se.

Sugestões da semana:
(Os preços, meramente indicativos, correspondem a valores de mercado)

Duas Quintas branco 2019
Região: Douro
Produtor: Ramos Pinto
Castas: Rabigato (50%), Viosinho, Arinto, Gouveio e Códega
Enologia: João Luis Baptista
PVP: €11,90
Marca já clássica da região, junta uvas do Bom Retiro e da Ervamoira. A grande consistência de qualidade faz dele uma aposta sempre segura.
Dica: a aposta vai sempre para a fruta madura mas com uma excelente frescura ácida que o mantém num registo muito atractivo. Perfeito companheiro da mesa.

Kopke Winemaker’s Collection Reserva rosé 2019
Região: Douro
Produtor: Sogevinus
Casta: Tinto Cão
Enologia: Ricardo Macedo
PVP: €20
Segunda edição deste rosé, desta vez com uma casta antiga mas com pouco protagonismo na região. Produção limitada de 2541 garrafas.
Dica: moderno no estilo, leve na cor, delicado no sabor, com boa complexidade de fruta e notas de tisanas mas os 13% de álcool apontam mais para a mesa do que para a esplanada. Apresentação cuidada.

Quinta do Crasto Vinhas Velhas tinto 2017
Região: Douro
Produtor: Quinta do Crasto
Castas: entre 25 a 30 castas misturadas na vinha
Enologia: Manuel Lobo
PVP: €28,89
A quinta fica no Cima Corgo entre a Régua e o Pinhão. Daqui saem também alguns dos mais famosos e caros vinhos da região. Deste tinto pode mesmo dizer-se que difícil é não gostar!
Dica: concentração, intensidade de fruta, boa madeira, aqui há de tudo mas em grande proporção. Um prazer, polivalente à mesa.

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