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Buscas no sótão das castas

Estiveram esquecidas mas renascem agora

Vivemos tempos interessantes no que toca ao assunto castas de uva para fazer vinho. Porquê? Porque o gosto actual mostra uma abertura a variados estilos e isso acaba por funcionar como alavanca para que os produtores se empenham na preservação das castas antigas. Já nestas crónicas falei várias vezes que, nas vinhas velhas, é normal encontrarmos muitas castas misturadas entre brancas e tintas. Uma das vinhas mais famosas, a Vinha Maria Teresa, tem mais de 40 castas misturadas mas a vinha do Legado tem mais de 20 e muitas outras vinhas velhas têm, perdidas no meio da confusão, muitas castas cujos nomes não conhecemos, não ouvimos falar e nem imaginávamos. Exemplos são às dezenas mas Tinta Malandra, Casculho, Cornifesto, Tinta Francisca, Touriga Fêmea, Tinta Nevoeiro, Mourisco de Semente, Tinta Roseira, Tinta Bairrada, Tinta Pomar e Boal Tinto são apenas algumas delas. É neste manancial que os produtores investigam e procuram quais delas poderão resistir melhor às alterações climáticas, quais as menos atreitas às doenças da vinha e as podem acrescentar um toque de originalidade ao portefólio. Estão neste caso os vinhos que sugiro hoje. O branco tem origem na Bairrada e a grafia deverá ser sempre com i e não com e para não se confundir com a variedade Cerceal Branco do Dão. É apenas um pequeno exemplo da dificuldade em uniformizar os nomes das castas de uva. Outros produtores da região bairadina, como Campolargo, já tiveram várias edições de brancos feitos com esta casta e com enorme reconhecimento internacional. A Malvasia Preta está muito presente nas vinhas velhas do Douro mas nunca se lhe reconheceu grande carácter para ser vinificada separadamente porque…não tinha cor! Há 30 anos este era um factor de exclusão. O Dicionário Ilustrado do Vinhos do Porto, editado em 2011, é omisso e a casta nem é referenciada. Na dição de 1999 do Oxford Companion to Wine (Jancis Robinson) referem-se as outras variedades (branca e roxa) mas a preta não consta. Malvasia é uma enorme família de castas dos países do Mediterrâneo e na versão branca, da Itália à Grécia e Creta, muitos são os vinhos feitos com ela (também na Madeira é usada). A preta ganhou a carta de alforria porque o factor “pouca cor” passou mesmo a ser valorizado por muitos consumidores. Daí o sucesso. A Tinta Francisca sempre foi usada para Porto, gerando vinhos doces mas com pouca cor. São já vários os produtores da região duriense a apostarem nela, uma variedade que “peca” pelo facto de ter pouca cor e andou por isso esquecida. Estes são três de muitos exemplos de vinhos que estão apostados em não deixar morrer o nosso património vitícola. Quase todas mal estudadas, ausentes em viveiristas (para se poderem comprar enxertos-prontos) e sem direito a benefícios da CE. Só dificuldades mas este é assunto para teimosos que não desistem à primeira.

Sugestões da semana:
(Os preços dizem respeito à Garrafeira Nacional, em Lisboa)

Quinta das Bágeiras Cercial branco 2016
Região: Bairrada
Produtor: Mário Sérgio Alves Nuno
Casta: Cercial
Enologia: Mário Sérgio/Rui Alves
PVP: €55,90
O mosto fermentou em barrica usada e foi engarrafado sem filtração. Cerca de 500 garrafas produzidas. Ainda está por decidir se haverá edição da colheita de 2017.
Dica: um branco que é um tinto, ou seja, complexo, robusto, anguloso e com excelente acidez. Já esgotado no produtor, existe no mercado.

Casa Ferreirinha Tinta Francisca 2015
Região: Douro
Produtor: Sogrape Vinhos
Casta: Tinta Francisca
Enologia: equipa dirigida por Luis Sottomayor
PVP: €76,90
3660 garrafas produzidas. Tem origem na quinta da Leda (Douro Superior) e, após vinificação em inox, estagiou 24 meses em barrica usada.
Dica: elegância e extrema finura tornam o vinho um perfeito companheiro para pratos de carne de pouco tempero.

Real Companhia Velha Séries Malvasia Preta tinto 2016
Região: Douro
Produtor: Real Companhia Velha
Casta: Malvasia Preta
Enologia: Jorge Moreira
PVP: €20
A colecção Séries corresponde a experiências, sempre com pequenas quantidades e por isso não se estranha as 600 garrafas produzidas. Se a aceitação for boa passa então para o portefólio da RCV.
Dica: um tinto elegante, aberto de cor, delicado e sem marca de madeira (só estagiou em barrica de 2º ano). Um prazer a beber e a preço convidativo.

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