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Assumir as diferenças

E há bons exemplos, como adiante se verá

Um dos vinhos que seleccionei para esta crónica – Ravera Barolo – tem origem no norte de Itália (Piemonte) e é feito a partir da casta Nebbiolo. A zona é de altitude, bem fria e com muita neve no Inverno e lá residem alguns dos mais famosos produtores de vinhos de Itália. Até aqui nada de muito surpreendente. O melhor vem a seguir, já que a Nebbiolo é uma casta muito difícil, gera vinhos taninosos e que não se conseguem beber em novos. Os produtores que visitei na zona – numa mini-embaixada de enólogos e críticos – foram taxativos: os vinhos são difíceis, precisam de 8 a 10 anos para começarem a amaciar e a mostrar o que valem mas… é mesmo assim. “Aqui ninguém quer mudar o perfil, por aqui não há intenção de amaciar os vinhos, modificar a forma de os fazer ou mudar as castas”, disse-nos o enólogo dos vinhos Mascarello e, no produtor Rinaldi ali ao lado, o tom foi o mesmo. Por aqui não houve cedências às modas dos vinhos macios, fáceis, redondinhos, com álcool elevado e açúcar residual. O método é infalível: quem não gosta não compra mas, como nos disseram, os melhores têm lista de espera e ninguém sabe o valor da terra pela simples razão de há muito anos não haver transacções, ninguém vende, logo, ninguém pode comprar. Este é um bom exemplo que poderíamos ter mais vezes em conta quando queremos afirmar os nossos vinhos, evitando a estandardização, fazendo vinhos diferentes, ainda que difíceis. Dois exemplos: em tempos, na antiga região da Estremadura, hoje Lisboa, pontificava a casta Tinta Miúda (Graciano, na Rioja espanhola) mas é casta difícil e por isso, muito mais fácil do que compreendê-la e estudá-la foi plantar Touriga Nacional e Syrah, o mesmo acontecendo com a branca Vital que lá vai sucumbindo ao peso dos Chardonnay, Viognier ou Sauvignon Blanc. No Alentejo passou-se o mesmo com a Castelão, Moreto ou a Grand Noir em Portalegre, rapidamente substituídas por Syrah, Alicante Bouschet e Touriga Nacional. E a Bairrada, tão ciosa da sua Baga, não pára de inventar alternativas porque…a casta é difícil. Das dificuldades que ela carrega já os produtores estão cientes bem como das possibilidades de contornar as limitações que apresenta mas…há lá coisa mais simples do que plantar Merlot, Cabernet Sauvignon ou Touriga Nacional para alegrar as hostes e pôr o povão contente? A casta Nebbiolo, que alguns notam similitudes com a Baga, é coisa para profissionais, gera tintos que com o tempo resultam elegantes, de bela acidez e muito nervo, tudo aquilo que dá personalidade aos vinhos. Ir a correr pelo caminho mais fácil pode ser rentável mas não nos traz nada de novo. A alternativa pode ser optar por um negócio de compromisso: faz-se vinho fácil para ajudar a pagar as contas mas faz-se também vinho “a sério”, ainda que possa ser complicado. Só desta maneira não se perde a face. E se o “diz que é uma espécie” de winewriter que supervisiona o país não gostar…problema dele!

Sugestões da semana:
(Os preços, meramente indicativos, correspondem a valores do mercado)

Ravera tinto 2015
Região: Barolo (Itália)
Produtor: Azienda Agricola Abrigo Giovanni
Casta: Nebbiolo
PVP: €55 (Import: Pedro Martin Boutique Wines). Em garrafeiras e restauração.
A cor mostra alguma evolução mas o aroma é fino e muito elegante, ainda que com taninos à flor da pele.
Dica: muito mais para beber o que para falar, é tinto de intenso sentido gastronómico.

Dom Martinho tinto 2018
Região: Reg. Alentejano
Produtor: Bacalhôa Vinhos de Portugal
Castas: Aragonez, Alicante Bouschet, Trincadeira e Cabernet Sauvignon
Enologia: Hugo Carvalho
PVP: €5,49
As castas são vinificadas separadamente na adega de Estremoz. Estágio em cuba de 6 a 9 meses, conforme a casta. É a segunda marca da Quinta do Carmo.
Dica: aromaticamente expressivo, com fruta, frescura e muita aptidão gastronómica. A beber novo que não merece estágio prolongado.

Paulo Laureano Vinhas Velhas Private Selection tinto 2016
Região: Alentejo
Produtor: Paulo Laureano
Castas: Aragonez, Trincadeira, Alicante Bouschet, Touriga Nacional
Enologia: Paulo Laureano
PVP: €17,30
Produzido na zona da Vidigueira, a zona por excelência de origem dos vinhos deste produtor.
Dica: denso, compacto, escuro no aroma mas com muito boa frescura de boca a compensar. Resulta em muito bom equilíbrio e pode melhorar em cave.

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