E, se recuarmos muito, só paramos na Bíblia Acontece com frequência. Temos tendência a pensar…
Foi surpresa? Talvez não…
Escondidos mas em forma
Os países que, como Portugal, têm antiga tradição vínica, tendem a ter sempre histórias relacionadas com o vinho, o seu consumo, acentuando o lado social e familiar que por norma tem. Isto também quer dizer que é muito habitual os consumidores terem vinhos em casa, alguns que até lhe chegaram dos pais ou que foram postos de lado há muito, escondidos em caves, arrecadações ou garagens. Sabemos hoje que os vinhos dão-se mal com estes tratamentos muito pouco aconselháveis e que, sem surpresa, acabam por transformar-se em vinagre (no mínimo). Com tanta falta de cuidado com os vinhos que nos deixaram o que acaba por surpreender é como é que alguns chegaram com saúde aos nossos dias. Nas últimas semanas tive experiências rigorosamente opostas quanto a este assunto: encontrei vinhos tintos que fizeram furor nos anos 70 e 80 – caso do tinto Francisco Ribeiro – e outros que não ambicionando grandes voos eram vinhos vulgares em toda a restauração – caso do Quinta do Convento (Abel Pereira da Fonseca) – ambos infelizmente já com a alma entregue ao Criador. Azar. Ao lado da pouca sorte vem, por vezes a taluda e não foi preciso esperar muito: um Herdade de Espirra feito com Castelão com 40 anos de idade mostrou porque a casta não merece ser tão esquecida como está a ser, um Coop. de Monsaraz de 1982 e um Portalegre de 1991 alegremente a dizerem-nos que quem acha que os tintos do Alentejo não são feitos para durar é capaz de estar enganado. O mais curioso é que, nos vinhos que estavam ainda em forma, é notável a preservação da cor, com grande intensidade vermelha, naturalmente (e ainda bem) macios e aveludados mas a darem um enorme prazer a beber. Quem diz tintos diz brancos porque pelo facto de terem normalmente uma acidez mais elevada que os tintos têm uma boa capacidade de viver em cave. Vinhos do Dão e da Bairrada dos anos 80 são brancos a ter em conta – desde as Caves São João até aos produtores engarrafadores da Bairrada como Luis Pato, Casa de Saima e Bágeiras são bons exemplos de vinhos brancos que nos surpreendem. Quando se tem a sorte de encontrar um bom vinho com saúde para alegrar uma roda de amigos é preciso ter alguns cuidados. No caso dos tintos velhos a decantação poderá ser perniciosa porque o arejamento intenso que resulta da passagem do vinho para um decanter, por exemplo, pode levar tudo a perder. Aconselha-se por isso que mal se abra a garrafa se prove para ter uma ideia do que fazer: aromas estranhos, pouco limpos? É melhor decantar que o arejamento só lhe fará bem; dá boa prova logo no primeiro contacto olfactivo? Óptimo, sirva directamente da garrafa com cuidado por causa do depósito mas evite decantar. Se for Porto velho é conveniente decantar em qualquer circunstância porque gera mais depósito. É por causa dos novos serem tão bons que os vinhos velhos estão em maus lençóis mas o verdadeiro apreciador é o que nunca diz não a uma boa prova…
Sugestões da semana:
(Os preços, meramente indicativos, correspondem a valores do mercado)
Alento Reserva tinto 2016
Região: Reg. Alentejano
Produtor: Luis Louro
Castas: Aragonez, Alicante Bouschet e Touriga Nacional
Enologia: Luis Louro/Inês Capão
PVP: €13
Muito bom o equilíbrio entre as quatro castas, pleno de fruta e com a barrica bem inserida no conjunto. Zona de Estremoz.
Dica: fino mas com pernas para andar, é tinto gastronómico para já e para os próximos 10 anos.
Encosta do Sobral Reserva tinto 2015
Região: Reg. Tejo
Produtor: Encosta do Sobral
Castas: Trincadeira, Touriga Nacional e Touriga Franca
Enologia: Marco Crespo (à data Pedro Sereno)
PVP: €9,99
Produzido no norte do Ribatejo, no concelho de Tomar, em solos xistosos muito pobres. Actualmente pertence à empresa Santos & Seixo.
Dica: muito harmonioso, o tempo que leva de vida fez-lhe muito bem. Polido mas com alguma austeridade e muito capaz para consumo imediato.
Porto Messias Vintage 2017
Região: Douro
Produtor: Vinhos Messias
Castas: várias da região
Enologia: Ana Urbano
PVP: €49,90
Neste ano clássico a Messias produziu um vintage muito completo, com grande estrutura mas muito fino e já a dar boa prova.
Dica: melhor mesmo é bebê-lo a solo ou a acompanhar queijos azuis. Guarde algumas garrafas.
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