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Desarmonias estivais

Há que não perder o gozo do convívio

O Verão, como sabemos, é altura ideal para convívios entre familiares e amigos. Às vezes é a grande confusão, sobretudo quando inclui miudagem pequena, mas também, com frequência, trata-se apenas de uma roda de apreciadores em volta de um petisco. Quando entra o vinho nesta equação colocam-se vários problemas. Deixamos, no entanto, de lado a temperatura, a idade do dito, a escolha entre brancos e tintos para peixe ou carne ou mesmo a substituição de todos os vinhos apenas por espumante. Hoje vamos falar apenas do tema ligação entre o vinho e a comida. O assunto pode ser muito simples ou muito complicado, depende da abordagem. Pelo que já me foi dado ver em múltiplos almoços e jantares onde o tema era importante, a ligação perfeita entre o vinho e o prato exige muita experimentação. Muito dificilmente à primeira se consegue encontrar o match perfeito e por isso, num restaurante com cuidados profissionais neste tema, tem de se experimentar o mesmo prato com vários tipos de vinhos para se encontrar “a” ligação perfeita. Dizer que o tinto liga com carnes e o branco com peixes ou marisco é uma banalidade, uma vez que, dependendo da confecção e dos temperos usados, a ligação pode, ou não, funcionar. Neste tema há também a considerar uma variável importante: eu posso querer dar a provar um vinho, por raridade, novidade ou qualquer outra razão, e isso pode ser factor mais importante do que o pairing. Nessas alturas o prato tende a passar para segundo plano e é no vinho que concentramos a atenção. É errado? Do ponto de vista do pairing é, mas a maluquice dos vinhos raros, diferentes, originais e atrevidos pode levar-nos a cometer erros destes. Já fiz asneiras destas vezes sem conta e com certeza que irei continuar, uma vez que quando recebo alguém em casa é quase sempre no vinho que vou servir que penso em primeiro lugar. A margem de entendimento entre vinhos e comidas é muito grande e, na maior parte dos casos, mesmo sem grande investigação ou estudo conseguimos uma boa ligação. Basta que alguns princípios sejam respeitados e provavelmente o mais importante é mesmo o do equilíbrio entre o “peso” do prato – onde vamos incluir o tempero, o nível de apuramento dos sabores e o próprio ingrediente principal (peixe ou carne) – e o peso do vinho; pratos fortes para vinhos fortes, pratos delicados com vinhos a condizer. Depois, por contraste ou mesmo oposição podemos tentar – mas aqui entramos na zona de risco – ligar pratos doces com vinhos ácidos e tintos velhos com sobremesas de ovos. O risco está sempre presente e há quem privilegie o convívio em detrimento da ciência do pairing. É o meu caso e não me tenho dado mal com isso. No entanto, e há que dizê-lo com frontalidade, quando se presencia um trabalho altamente profissional ficamos esmagados pela minúcia e precisão que tal trabalho exige. São mundos diferentes em que o “vale tudo” não deve ter cabimento mas onde a tolerância, especialmente no Verão, também tem o seu lugar.

Sugestões da semana:
(Os preços, meramente indicativos, foram fornecidos pelos produtores)

Esporão Colheita branco 2018
Região: Reg. Alentejano
Produtor: Esporão
Casta: Antão Vaz
Enologia: David Baverstock e Sandra Alves
PVP: €10
Vinho biológico, parcialmente fermentado e estagiado em cubas de betão em forma de ovo.
Dica: boa complexidade aromática, fruta madura com sugestões de fruta exótica. Muito bem conseguido na boca, um belíssimo branco, redondo e cheio.

Coelheiros Vinha do Taco tinto 2010
Região: Reg. Alentejano
Produtor: Herdade de Coelheiros
Casta: Petit Verdot
Enologia: Luis Patrão
PVP: €45
Intencionalmente colocado à venda com muitos anos de estágio. A propriedade pertence desde há alguns anos, a um casal brasileiro.
Dica: perfeito para quem aprecia os tintos já com alguma evolução, cheios e acetinados. Cuidado com os 15% de álcool.

Ponte tinto 2015
Região: Alentejo
Produtor: Herdade d Mouchão
Castas: Touriga Franca, Touriga Nacional, Syrah
Enologia: Paulo Laureano
PVP: €18,90
Este tinto já se chamou Ponte das Canas. Contempla as outras castas que a herdade também tem, para além da famosa Alicante Bouschet.
Dica: volume, estrutura mas uma boa elegância de conjunto, tornam este vinho um sucesso, sobretudo à mesa com a gastronomia regional.

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