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Aprender sempre

Mas com lucidez, por favor

Andamos frequentemente a dizer que já está tudo inventado, que já nada nos surpreende, que tudo cheira a déjà vu. No caso da gastronomia (vinhos e culinária) não é bem assim e temos vindo a assistir a novas abordagens da forma de trabalhar as uvas e os alimentos. Os chefes procuram novos ingredientes, as técnicas apuram-se (quem imaginaria cozeduras a vácuo a baixa temperatura, por exemplo) e há novos produtos a descobrir, seja na selva mais profunda seja à beira-mar. Nos vinhos passa-se um pouco o mesmo e estamos sempre a descobrir novas técnicas. Por vezes a Natureza encarrega-se de desmentir o saber acumulado e que julgávamos adquirido mas, afinal, esse saber esbarra nos caprichos imprevisíveis do clima. A vinha tem de enfrentar imensos inimigos, alguns microscópios, uns debaixo da terra, outros no interior da cepa, outros nas folhas e muitos também nos próprios bagos. É ao produtor que depois se pede atenção permanente, qual sentinela à porta do quartel. O vinho não se faz sozinho e se deixarmos o clima fazer das suas é certo que não vamos ter vinho. Por isso mesmo ele é um produto da acção do homem e não apenas um milagre da natureza; essa tese milagreira tenta ser passada por alguns produtores que, ainda bem para eles, encontram sempre alguém disponível para acreditar nisso. Mesmo os produtores que apostam em agricultura biológica têm, a certa altura, de decidir se querem ter uvas ou se querem continuar com o método. Aconteceu em França (Borgonha, por exemplo) onde muitos produtores bio se viram forçados a abdicar da certificação na vindima passada para poderem tratar as moléstias eficazmente. É que o míldio e o oídio não se compadecem com medidas assim-assim e podem deitar a colheita a perder. Ora se em zonas borgonhesas como Meursault se pagam algumas uvas a €40 o quilo (leu bem…) torna-se evidente que não há filosofia que resista se o assunto for “salvar a colheita”. Vários produtores portugueses que em tempos apostaram no método acabaram por abandoná-lo porque não adianta ser bio se o vizinho tem a vinha maltratada ou mesmo abandonada; a bicharada passa alegremente de um lado ao outro. E se há zonas mais secas onde as práticas bio são mais fáceis, já nas zonas mais húmidas, o trabalho excessivo e a pegada de carbono que uma vinha bio exige (muitas passagens na vinha e muito cobre no solo), pode não compensar. Espera-se assim lucidez por parte dos produtores para saberem onde estão e o que têm de fazer, sem fundamentalismos. “Não tenho paciência para os talibãs do vinho”, dizia-me há dias um produtor borgonhês. Sulfitos? Pois é evidente, dizia, com juízo e o mínimo possível mas sempre com a saúde do vinho em vista. Para ser bom agora, daqui a 6 meses e daqui a alguns anos. E se é assim desde o tempo dos romanos por alguma razão será. Por isso também temos de relativizar o que nos dizem e do que nos querem convencer. E as mentiras andam aí…

Sugestões da semana:
(Os preços, meramente indicativos, foram fornecidos pelos produtores)

Dona Matilde branco 2018
Região: Douro
Produtor: Quinta D. Matilde
Castas: Arinto, Viosinho, Gouveio e Rabigato
Enologia: João Pissarra
PVP: €9
A vinha (com frente de rio entre a Régua e Pinhão) tem 28 ha e esta é a 11ª edição do branco. Tem também tinto e Vinho do Porto.
Dica: grande equilíbrio numa frescura ácida em diálogo com a fruta fresca.

Bojador branco 2018
Região: Reg. Alentejano
Produtor: Espaço Rural
Castas: Antão Vaz, Arinto e Alvarinho
Enologia: Pedro Ribeiro
PVP: €7
Lote de uvas de vinhas da zona da Vidigueira, fermentadas em conjunto (lote feito na vinha).
Dica: fruta branca no aroma, texturado e com volume de boca, muito gastronómico.

Vinho do Porto Lágrima das Damas branco
Região: Douro
Produtor: Ramos Pinto
Castas: lote de castas da região
Enologia: Ana Rosas
PVP: €11,99
As uvas têm origem na quinta da Ervamoira e a imagem é inspirada no antigo rótulo de moscatel da casa.
Dica: aroma discreto, boca exuberante de fruta, doçura e acidez. Para consumir fresco, como aperitivo ou à sobremesa. Final macio e longo.

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