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O clima às avessas

E sofre mais quem trabalha bem

O ano de 2018 dificilmente poderia ser mais complicado do que está a ser. Estamos em fins de Julho e, nas vinhas, as uvas tintas mal começaram a “pintar”, termo que designa a gradual mudança de cor dos bagos. Tudo muito atrasado, portanto, e para isso muito contribui a falta de calor, este clima adverso que fez questão de mostrar este ano toda a parafernália de maldades que pode fazer ao lavrador. A vinha é uma empresa a céu aberto e como tal sujeita a tudo o que puder acontecer. E em 2018 já aconteceu quase tudo (resta saber ainda se não haverá chuva na vindima para acabar com o resto…) e, sobretudo no norte do país, a carga de míldio que atacou as vinhas foi de dimensão homérica, tal como foi o granizo que varreu muitas zonas, deixando atrás de si um rasto desolador. Olhar para as cepas era estar a ver um ser mais morto que vivo, castanho, despenteado e com ar moribundo. A zona do vale do rio Pinhão (Douro) é atreita a este fenómeno mas este ano foi muito além do habitual. Quem escapou “entre os pingos da chuva” teve de se precaver contra o míldio, tratando apressadamente para salvar a colheita. Mas aqui joga um factor perverso e que decorre do sistema de benefício do Vinho do Porto. O exemplo pode colocar-se assim: Eu trato a minha vinha para evitar os malefícios do míldio mas se o meu vizinho do lado, que tem benefício para uvas destinadas a Vinho do Porto, vende o cartão sem uvas e não trata a vinha (algo que não é legal mas que é mais vulgar no Douro que a rotação das estações do ano…), as consequências imaginam-se; por mais que eu trate a minha vinha, a parcela do lado é um viveiro de uvas infectadas que inevitavelmente irão atacar tudo o que estiver à volta, sem qualquer hesitação. Sofrem todos, sobem imenso os custos da exploração e no final só beneficia o lavrador desleixado que não tratou das vinhas. É perverso? Claro que é, mas enquanto o sistema teimar em não se modificar, é de histórias deste tipo que vamos continua a ouvir. O clima, de tão avariado, não deixa também grande espaço para os produtores alternativos, nomeadamente os que defendem e praticam uma agricultura biológica e biodinâmica, teoricamente menos intrusiva e que se pretende mais respeitadora do ambiente. É que, com esta quantidade de ataques de míldio, não há “biologia” que se aguente e é preciso tomar uma de duas opções: tratar com químicos e abandonar (ainda que temporariamente) a certificação, ou sujeitar-se a que a vindima seja só assunto do ano que vem, que neste já estamos conversados. Mas é também em anos assim que alguns produtores reclamam das virtudes das opções alternativas que tomaram, para nos fazer acreditar que a “vinha se defendeu por si”, tese que lhes é muito cara mas que, em anos como o 2018, pode sair caríssima. Como o país não é uniforme e as variações estão à espera ao virar do primeiro monte ou serrania, há ainda a esperança de se poder conseguir algum vinho bom em 2018. É caso para dizer: S. Pedro e o seu staff escusavam de ter posto, no mesmo ano, a carne toda no assador. Livra…

Sugestões da semana:
(Os preços foram fornecidos pelos produtores)

Monólogo 2017
Região: Vinho Verde
Produtor: A & D Wines
Casta: Malvasia Fina
Enologia: Fernando Moura
PVP: €8
A casta é rara na região e ainda mais rara como varietal. As vinhas estão em conversão para modo biológico.
Dica: muita fruta branca, toque floral, perfeito para peixes com molho de manteiga. E lá mais para o Outono continuará a ser grande parceiro, então de pratos mais quentes e com mais confecção.

Fiuza branco 2017
Região: Reg. Tejo
Produtor: Fiuza & Bright
Casta: Riesling
Enologia: Paolo Nigra/Peter Bright
PVP: €6,49
Aroma discreto à casta mas muito boa frescura de boca, seco e elegante.
Dica: conjunto estival, a pedir pratos leves, mesmo que só de legumes.

Quinta da Bacalhôa tinto 2005
Região: Reg. Terras do Sado
Produtor: Bacalhôa Vinhos de Portugal
Castas: Cabernet Sauvignon e um pouco de Merlot
Enologia: Filipa Tomás da Costa/Vasco Penha Garcia
Não se apresenta o PVP porque a intenção é lembrar que estes vinhos resistem maravilhosamente à cave e são o melhor exemplo que temos entre nós de tinto de inspiração bordalesa. Procure na sua cave ou esteja atento em garrafeiras que possam ainda tê-lo disponível.
Dica: decante previamente e sirva a acompanhar carne vaca grelhada. Um sucesso!

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