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Os vinhos têm rosto
A Sogrape tinha um, de enorme dimensão, que agora nos deixou
Com a morte de Fernando Guedes o vinho português perde um dos seus grandes senhores, uma figura afável, respeitada, charmosa que irradiava simpatia à sua volta. Como se imagina, muitas foram as figuras que marcaram a nossa história vinícola mais recente. Uns mais ligados à gestão e outros à produção, uns combatentes por ideais, outros reservados, investigadores e académicos. Alguns já partiram, e relembro aqui Luiz Costa das Caves S. João e o Prof. Colaço do Rosário, outros felizmente ainda estão entre nós. Fernando Guedes era a verdadeira figura do patriarca, do chefe do clã, a figura tutelar de uma família que respirava e respira vinho. Conheci-o há 25 anos quando o projecto da quinta dos Carvalhais (Dão) dava os primeiros passos, recebeu-me em Avintes quando ali estive a fazer as provas para um dos meus primeiros guias de vinhos, eu um jovem provador e ele um senhor do vinho mas nada disso impediu que a simpatia, a cordialidade e o afecto fossem menores. Lembro-me que me fez sentir muito mais importante do que eu próprio me sentia, respeitando opiniões e pedindo sinceridade nas críticas. Quando em 2001 lhe foi atribuído o prémio Senhor do Vinho, relembro as suas palavras ao microfone, enquanto tirava um papel do bolso: “um improviso prepara-se em 24 horas e eu nem esse tempo tive!” Deu, acredite-se, muito boa conta da situação e o prémio foi mais que justo. Gerir uma empresa como se conduz os destinos de uma família não deve ser ensinamento que venha nos actuais livros de gestão, cheios que estão de rebranding e refreshing com outsourcing para evitar o downsizing, mas Fernando Guedes veio do tempo em que um aperto de mão valia mais que todos os contratos de notário e em que a palavra dada tinha força de lei. Sobrava-lhe depois o gosto pelos pormenores, pelo requinte que saba impor mesmo em instalações, como as adegas, onde sobrava muito pouco espaço para espraiar o bom gosto que tinha. Visitava habitualmente todas as quintas e em todas elas tinha o “olho clínico” sempre atento aos pormenores. O Alentejo ia-lhe muito a gosto e na herdade do Peso sentia-se no céu; “adoro vir aqui, gosto do ar que se respira, da calma e da dimensão do horizonte”, não se cansava de dizer. Com ele confirmámos que a gestão familiar é possível, mesmo quando a empresa se torna um gigante com investimentos em vários países e que ainda detém o vinho português, à parte o Vinho do Porto, mais conhecido no Mundo, o Mateus rosé. Sentia um enorme orgulho neste vinho criado pelo seu pai Fernando Van Zeller Guedes; soube modernizá-lo sem lhe retirar o selo original: um vinho leve, com algum gás e açúcar, a verdadeira bebida de esplanada. A defesa dos princípios familiares orientadores da gestão passou-o aos seus filhos agora na direcção da Sogrape. E o Mateus, honra lhe seja feita, continua a crescer e a espalhar o nome de Portugal pelo mundo, mais de 60 anos depois de ter sido criado. Não é fácil, é dificílimo.
Sugestões da semana:
(Os preços foram fornecidos pelos produtores)
Kaputt branco
Região: Douro
Produtor: Barão de Vilar
Castas: variedades antigas da região
Enologia: Álvaro van Zeller/Manuel Vieira
PVP: €30
Não indica data porque é lote de várias colheitas. Apenas se produziram 2645 garrafas.
Dica: muito estruturado, cheio, com boa acidez. Um branco sério, original e bom para a mesa, com pratos de bom tempero, incluindo carnes.
EA rosé 2017
Região: Reg. Alentejano
Produtor: Fundação Eugénio de Almeida
Castas: lote de quatro variedades
Enologia: Pedro Baptista
PVP: €4,99
Cor salmonada, aroma fino, directo e bem atractivo.
Dica: com esta harmonia de boca, será perfeito com pequenos acepipes ou saladas.
Esporão tinto 2016
Região: Alentejo
Produtor: Esporão
Castas: Touriga Franca, Cabernet Sauvignon
Enologia: equipa dirigida por David Baverstock
PVP: €10
Vinho de produção biológica, estagiado em cubas de cimento.
Dica: aberto na cor, imensa frescura aromática, um vinho muito consensual, é mesmo difícil não nos cativar.
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