Já é possível algum balanço da vindima de 24 À hora desta crónica “vir a…
Colher tarde para beber cedo
As uvas são assim, dão para tudo
Vindimar em Dezembro não é, seguramente, uma prática habitual. Por muitas razões, sendo que uma delas é o apodrecimento das uvas, provável com as chuvas do outono. Mas quando não apodrecem com a chuva, as uvas ficam na cepa e acontece progressivamente um fenómeno de concentração de açúcares e de acidez e por isso essas uvas são muito mais doces. Nasceu então assim a ideia de fazer um vinho doce. Convencionou-se chamar-lhe um vinho de Colheita Tardia. Há muitas maneiras de fazer este tipo de vinho e até há hoje formas de “fabricar” um colheita tardia mais cedo, ou seja, não é preciso esperar por Dezembro para fazer um vinho doce. Costuma dizer-se que há perguntas que não se devem fazer a enólogos e esta do “fabricado” ou “natural” é de evitar já que poderemos não obter a resposta verdadeira. Mas voltemos ao colheita tardia: hoje é possível fazê-lo em qualquer região e em quase todos os cantos do mundo. É verdade que alguns ganharam justificada fama e são os mais cotados do planeta; estou a pensar em França (Sauternes – feitos de Sémillon/Sauvignon -, Alsácia e Loire), Alemanha (Mosel), Hungria (Tokaji) e África do Sul (Klein Constantia). Entre nós, só em 1988 surgiu o primeiro com o nome Late Harvest no rótulo, da empresa João Pires, feito com Fernão Pires. Hoje está morto mas à época foi um sucesso, aqui e lá fora. De então para cá aumentou muito o número deste tipo de vinhos mas só alguns deles merecem verdadeiro destaque. No grosso da coluna encontramos vinhos doces com boa acidez e álcool moderado mas a que falta alma e personalidade. No meio destes, temos alguns que merecem destaque, justificam a procura (nem sempre são fáceis de encontrar) e podem surpreender mesmo os palatos mais exigentes. Alguns deles nascem no Douro (Grandjó, Olho no Pé, Aneto), outros nos Vinhos Verdes (Ameal, QM) e em quase todas as regiões vamos encontrar estes vinhos que, conforme a associação vinho/comida que se fizer, tanto podem ser vinhos de entrada como de sobremesa. Tradicionalmente a ligação foie-gras/Sauternes é um dos grandes clássicos da culinária francesa, algo que os gauleses continuam a praticar na época natalícia sem ligar muito às campanhas anti foie-gras que grassam por esse mundo. Vive la France! O vinho deve ser servido bem fresco e rende muito porque cada conviva acaba por consumir uma dose bem pequena. Por experiencia sei que uma garrafa de ½ litro dá bem para 6 pessoas, resultando assim um preço per capita muito baixo. Não há assim razão para não se consumir um bom vinho. Como companheiro de final de refeição, e sempre bem fresco, o Colheita Tardia pode ser parceiro de sobremesas desde que não excessivamente doces, tais como arroz-doce, tarde de pêssego ou alperce, sempre sugestões onde o peso dos ovos não seja excessivo. Hoje sugerimos três vinhos deste tipo, todos de grande calibre e classe. Há que conhecê-los, sem o preconceito patético de que são “vinhos para senhoras” como já várias vezes ouvi.
Sugestões da semana:
(Os preços – meramente indicativos – foram fornecidos pelos produtores)
Aneto S Colheita Tardia branco 2010
Região: Douro
Produtor: Sobredos
Enologia: Francisco Montenegro
Casta: Semillon
PVP: €35 (garrafa de 0,5 l)
Esta marca já existe há alguns anos. Este é uma edição especial. Foram produzidas 1500 garrafas.
Dica: concentrado, rico, muito aromático, muito glicerinado. Um prazer.
Falcoaria Colheita Tardia branco 2014
Região: Tejo
Produtor: Casal Branco
Enologia: Manuel Lobo Vasconcelos
Castas: Viognier/Fernão Pires
PVP: €18 (garrafa de 0,375 cl)
É a estreia deste produtor neste tipo de vinho. Vinhas velhas em Almeirim.
Dica: grande qualidade, muita concentração, aroma de grande nível, bela acidez. A conhecer.
Klein Constantia branco 2008
Região: Constantia (Af. Do Sul)
Produtor: Klein Constantia
Casta: Muscat de Frontignan
PVP: €59,50 (garrafa de 0,5 l) na Garrafeira Tio Pepe – Porto
Marca clássica renascida já neste século. Um moscatel de elevado nível.
Dica: vinho raro, merece ser conhecido já que a fama remonta ao séc. XVIII.
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